Racismo no futebol: atletas e profissionais do esporte são alvos de preconceito racial há muito tempo

Demba Ba discute com o quarto árbitro após comentário caso de racista em PSG x Instanbul Basaksehir na Liga dos Campeões- Crédito: FRANCK FIFE / AFP

Uma retrospectiva nada agradável de ser feita, mas necessária, afinal a pauta sobre racismo será sempre urgente. A relevância do tema permite voltar no tempo e tentar estimular uma reflexão sobre o quão perverso é o preconceito racial.

Charge que representava os jogadores da seleção brasileira como macacos – Créditos: Reprodução

Em 1920, a seleção brasileira fez um amistoso na Argentina contra a seleção dona da casa, a notícia que os jogadores brasileiros estavam no país argentino virou manchetes em vários jornais, mas em uma delas continha uma charge referindo aos brasileiros como “macacos”.

Na época, o então presidente Epitácio Pessoa tomou uma atitude no mínimo controversa, não defendeu a seleção brasileira, e ainda ordenou que no ano seguinte diminuíssem a quantidade de jogadores negros na seleção, convocando mais jogadores de pele clara e cabelo liso.

Mais de 90 anos depois, em 2013, o então técnico Lula Pereira, homem negro, numa entrevista à revista Placar, disse: preto é visto como um “tampão” pelos clubes. Ele percebeu que, aquilo que tinha acontecido com ele não estaria relacionado à competência, mas a cor da sua pele.

“Já ouvi de empresários: ‘O pessoal do clube gostou do seu perfil, mas, me desculpe, você é preto’”- Lula Pereira – Créditos: reprodução

No ano de 2014, o estádio El Madrigal, na Espanha, foi palco de um ato racismo, a vítima, o jogador brasileiro Daniel Alves. Torcedores jogaram banana no atleta enquanto ele estava em campo, que em reação ao acontecido, pegou a banana e comeu, e segue o jogo.

Durante uma entrevista, Daniel Alves foi perguntado sobre o ” incidente com a banana, o jogador respondeu: “Incidente com a banana? Estou em Espanha há 11 anos e isto acontece desde o início. Há que rir destes retardados. Não sei quem a jogou, mas tenho que agradecer, pois deu-me energia para outros dois cruzamentos que acabaram em gols”, comentou.

É notório que o racismo está em todas as esferas da sociedade e não seria diferente no meio do esporte, mesmo sendo um dos esporte mais “democrático”, mas é dentro das quatro linhas que também se percebe uma das teias do racismo estrutural.

Algumas pessoas dizem que no futebol europeu não existe racismo, devido ao nível intelectual da sociedade, lei do engano, existe sim. Não só existe como já tem deixado de ser atos velados. O que há é  muitas vezes são algumas instituições que simplesmente ignoram, naturalizam, sem dar a devida credibilidade ao assunto, principalmente quando não há câmeras. 

Caso recente

Passados quase um século do episodio com a seleção brasileira, citado no início do texto, o mundo assistiu, literalmente, a mais uma cena de ato racista.

No último dia 8, as coisas não puderam ser jogadas para “escanteio”, o Camaronês Pierre Webó, integrante da comissão técnica do time turco Basaksehir, sofreu ofensas racistas pelo quatro árbitro Romeno Sebastian Coltescu durante a partida entre os times PSG e Istanbul Basaksehir pela Liga dos Campeões da União das Associações Europeias de Futebol (UEFA).

O episódio foi percebido e gerou revoltas e manifestações dentro de campo por parte da comissão técnica e dos jogadores.

Graças a reação imediata dos atletas e outros profissionais, as câmeras flagraram o repudio contra o ato, e não puderam abafar o assunto e ignorar o que estava acontecendo, principalmente para os telespectadores que assistiam ao vivo aquele momento histórico.

Esse momento ainda ganhou mais força nas redes sociais quando o time turco publicou uma foto onde estava escrito “Não ao Racismo”.

Narradores reconhecidos nacionalmente, se pronunciaram com relação ao que estava acontecendo, e sendo visto por milhares de pessoas, muitos deles indignados com o que estavam assistindo.

Tudo começou quando lateral do Stanbul, o brasileiro Rafael foi punido com um cartão amarelo. Alguns membros da equipe chegaram a questionar tal punição, e nesse momento, de a cordo com os relatos de jornalistas da imprensa francesa, espanhola e italiana foi ouvido a frase, “vai embora, preto”, em direção a Webó.

Webó se revoltou e começou a questionar a Coltescu “O que você falou? Porque você falou preto?”. Nesse momento, o árbitro principal, se aproximou e deu um cartão vermelho para o camaronês. Demba Ba então começou a gesticular para que os companheiros deixassem o campo, fazendo com que esse momento se tornasse histórico no Parque dos Príncipes, pois os jogadores de ambas equipes começaram a deixar o gramado no meio do primeiro tempo.

Isso mostra que ter uma classe social privilegiada não te excluirá de ser vítima de racismo, uma vez que independente da sua condição financeira, em quem qualquer país, a cor da pele vai ser motivo de desmerecimento. 

Jogadores fazem protesto antirracista no recomeço do jogo entre PSG e Istanbul- Crédito: FRANCK FIFE / AFP

A partida remarcada para o dia seguinte, quarta-feira, 9, começou com os jogadores de PSG e Istanbul Basaksehir ajoelhados em forma de protesto contra o racismo.

A UEFA prometeu fazer uma profunda investigação sobre o caso. “A Uefa está ciente do incidente durante o jogo da Champions League, entre Paris Saint-Germain e Istanbul Basaksehir e vai conduzir uma investigação completa. Racismo, e discriminação de qualquer forma, não têm espaço no futebol”.

*Este texto trata-se de uma opinião do autor.

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