Periferia é central: Coletivo Resistência Preta e políticas públicas em Salvador

O Coletivo Resistência Preta, promoveu um encontro com representantes de organizações sociais que atuam na periferia de Salvador, tendo como tema central: Políticas Públicas na Comunidade Negra e Periférica, além da apresentação dos projetos realizando nos últimos anos, como o Núcleo de Mulheres, Conselho Comunitário e líderes do CRP. A insegurança alimentar foi um dos debates do encontro. Além do reconhecimento das mulheres negras na sociedade e o papel da juventude na construção da sociedade.

O Coletivo Resistência Preta, é uma plataforma social do movimento negro atuante em Salvador, com foco nas periferias através das políticas públicas. O encontro temático do CRP acontece anualmente, e nesse ano foi realizado nos últimos dias 23 e 24 (sábado e domingo).

Dhay Borges (Coordenador Geral do CRP), destaca a importância do projeto e do encontro. “Uma das premissas do nosso coletivo é atuar dentro dos territórios marcado por extremas violências históricas, tanto do ponto de vista da situação dos quilombolas, das ocupações urbanas, trazeendo para o centro do debate as várias identidades existentes na cidade de Salvador que vivem camufladas”.

Foram analisados os resultados da ações realizadas no ano anterior, principalmente os avanços das pautas destacadas e quais serão os próximos passos para a realização dos objetivos em 2024, que já iniciou uma atividade de extensão em Políticas Públicas Educacionais, na Universidade Federal da Bahia-UFBA, para alunos e professores.

Além da luta antirrascista, o CRP busca formas de desenvolvimento de projetos que possam favorecer jovens, homens e mulheres da classe trabalhadora oriundos de comunidades negras e periféricas, dentro da empregabilidade e empreendedomo para a manutenção e amplificação de renda das famílias.

“Uma ação comunitária que coloque um holofote para dentro das periferias apresentando a capacidade orgânica desses territórios que tanto colaboraram para construção do país. Nós somos remanescentes desse processo ancestral, dessa ancestralidade porque reúne terreiro, igrejas, iniciativas comunitárias a exemplo de creches comunitárias que tratam o debate da consciência ambiental por meio das hortas comunitárias também”, relata Dhay Borges.

Lais Santana, coordenadora do CRP, fala da importância dessa articulação. “A gente entende a necessidade de trabalhar essa perspectiva de fortalecimento, de rede de articulação comunitária e é isso que nós fazemos enquanto Coletivo Resistência Preta. Para 2024 o nosso principal objetivo é continuar nutrindo, organizando, unindo, unificando essas lideranças, os projetos comunitários na perspectiva a partir dos núcleos, que desempenham papéis importantes dentro da comunidade, tornando mais organizada. O núcleo jurídico por exemplo, é uma ferramenta de democratizar o acesso à justiça. Há também o núcleo de juventude, que envolve principalmente a juventude negra, na construção política, e o nosso papel é tornar isso possível, palpável, tangível a partir dos círculos que nós fazemos”.

As ações realizadas por parte do coletivo têm sido reconhecidas pela comunidade de forma exponencial.

Juliane Macedo, uma das participantes do encontro, relata que: o coletivo traz conhecimentos para as mulheres negras de comunidades periféricas, colocando-as como protagonistas de suas histórias. Eu sou uma mulher preta e periférica, que fui condicionada a seguir determinados caminhos de trabalhar, me sustentar e só. E hoje a gente consegue ver com coletivo que nossos descendentes podem ter algo muito maior que a gente teve. Eles podem fazer parte do que eles quiserem e chegar aonde eles quiserem, porque eles têm o direito disso e a gente pode estar em qualquer lugar que a gente quiser”.

Rafael, representante da Ocupação Massaranduba, que luta por moradia digna, destacou a ajuda que teve do projeto no período da pandemia, com alimentação. “O Coletivo Resistência Preta entrou na nossa vida na época da pandemia oferecendo cestas básicas, foi um momento muito difícil que a gente viveu nesse país, onde os menos favorecidos ficaram totalmente vulneráveis, né? Uma era um grau de vulnerabilidade muito grande tanto social como econômica a gente não tava conseguindo porque não tinha como trabalhar e a nossa vida ficou realmente muito complicada”.

Emily Sacramento, Coordenadora do Núcleo de Juventude, destaca a importância de estar no evento. “Está com pessoas de diferentes lideranças, fazer partes desse coletivo é muito importante, um momento de articulação política, de pensar os feitos que já foram conquistados, falar da nossa trajetória, mas além disso, pensar novas perspectivas, falar sobre futuros projetos. É um projeto de grande potência na cidade de Salvador”.

Para Catharina Maia, também do núcleo de juventude e de mulheres, o ano de 2023, foi um ano de muitos desafios, ano em que as atividades presenciais estavam sendo retomadas (pós pandemia) e também a transição de governo. “O ano de uma nova conjuntura política, então a gente tinha boas expectativas, mas ao mesmo tempo não foi tão fácil assim como a gente esperava, né? Com a transição de governo o quadro mudou, coisas melhoraram em algum sentido, alguma pontinha de esperança nesse sentido das políticas públicas para as pessoas pretas, mas a gente ainda encontra cenários de marginalização, os territórios com grande problemas na ocupação, de validação das lutas periféricas, em destaques, mapear esses territórios, se mobilizar pelas lutas próprias e particulares e tentar somar forças para buscar políticas públicas e cobrar do poder público”.

Mona Kizola, integrante do CRP, atua com poesias, tendo o conhecimento como arma, levando aos jovens de periferia uma estratégia de apoiar e elevar um povo que muitas vezes é esquecido pelo sistema, visando entender os seus direitos; direito à vida, de ir e vir, à saúde, a educação, entre outros. Trazendo a juventude para lutar e reivindicar por tudo aquilo que não é nos dado e que nos foi tirado há muitos anos, desde o tempo da escravidão”.

Em suas poesias, Mona, também provoca reflexões para a sociedade de quanto a população negra sofre:[…]”hoje tudo mudou. Eu sou poder, eu sou a liberdade, eu sou a verdade, eu sou o sorriso de quem venceu a maldade, eu sou a neta do Congo, eu sou a que causa espanto, eu sou a que dá orgulho, eu sou a senzala que aprendeu a ler, escrever, eu sou a que você tanto humilhou[…] – trecho da poesia: Eu Sou Uma Leoa Africana de Mona Kizola.