Deputados estaduais estarão armados na ALERJ

SESSÃO PLENÁRIA ORDINÁRIA DO DIA 10 DE ABRIL DE 2019 FICA CONTURBADA DEPOIS DO SUBSTITUTIVO APRESENTADO PELO DEPUTADO ESTADUAL MÁRCIO PACHECO. FONTE: THIAGO LONTRA.

A bancada dos deputados estaduais “da bala”, da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, aprontara um “jabuti”, assara um “bacalhau” e perfurara um guarda-chuva a balas na votação do PL nº 1.825/2016, que dá prerrogativas aos agentes socioeducativos do DEGASE para o porte de armas de fogo. Não bastasse esta corrupção jurídica em transportar um sistema sob os auspícios da Secretaria do Estado da Educação, do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) e do ECA, como o DEGASE, para o sistema penal e o sistema carcerário. Como aquele dito popular de que “se der a mão, eles comem o braço”, o deslize jurídico fez sambar a casa legislativa sob a infantaria bélica. No final da votação, o inesperado aconteceu: um substituto apresentado pelo deputado Márcio Pacheco (PSC), pela Comissão de Constituição de Justiça, estendeu o porte de armas de fogo a deputados estaduais no exercício da função, auditores fiscais de carreira do Estado e do município, à polícia legislativa e, finalmente, aos agentes socioeducativos.

À DIREITA VOLVER !

Maio de 2016 exalava o estertor da abertura pelo senado federal do processo de impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff, após a autorização da Câmara dos Deputados no dia 17 de abril. Era uma vez o prenúncio dos ventos conservadores que tomarão o leme da nau brasileira cada vez mais à direita, a partir de então, e cujo desenrolar atingirá intensidade inesperada para uma testemunha viva naquele momento. E o baque se fez sentir na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ) no dia 31 daquele mês.

O Deputado Estadual Marcos Muller (PHS) apresentou o Projeto de Lei nº 1825/2016, por despacho legislativo, que disponibilizaria, no seu Artigo 2º, o “porte de arma de fogo para os Agentes de Segurança Socioeducativos do Departamento Geral de Ações Socioeducativas do Estado do Rio de Janeiro”. O Departamento Geral de Ações Socioeducativas, o Degase, criado pelo Decreto 18.493 de 1993, é um órgão vinculado à Secretaria do Estado de Educação e é responsável pela aplicação de políticas socioeducativas a adolescentes em conflito com a lei. Diferentemente do Sistema Prisional, que é subordinado ao Ministério da Justiça em observância à Lei de Execuções Penais nº 7.210/1984 e à Constituição Federal de 1988, o Sistema Socioeducativo obedece às determinações do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a Lei nº 8.069 de 1990.

PROJETO DE LEI Nº 1825/2016

EMENTA:

DISPÕE SOBRE O PORTE DE ARMA DE FOGO PARA OS AGENTES DE SEGURANÇA SOCIOEDUCATIVOS DO DEPARTAMENTO GERAL DE AÇÕES SOCIOEDUCATIVAS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

Autor(es): Deputado MARCOS MULLER

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO RESOLVE:

Art. 1º – Os Agentes de Segurança Socioeducativos, ativos e inativos, gozarão das seguintes prerrogativas, entre outras estabelecidas na legislação federal:
I – ser portador de documento de identidade funcional com validade em todo território nacional e padronizado na forma da legislação pertinente;
II – ser recolhido em prisão especial, à disposição da autoridade competente, até o trânsito em julgado de sentença condenatória, e, em qualquer situação, separado dos demais presos;
III – ter prioridade nos serviços de transporte, saúde e comunicação, públicos e privados quando em cumprimento de missão;
IV – ter porte de arma, categoria defesa pessoal, em ambiente fora do âmbito do sistema de atendimento ao adolescente infrator.
Parágrafo único – Não havendo estabelecimento específico para o preso nas condições do inciso II dessa legislação, os Agentes Socioeducativos serão recolhidos em dependência distinta dos demais presos no mesmo estabelecimento, a ser designada pela autoridade competente, por orientação da Secretaria de Administração Penitenciária, até o trânsito em julgado da sentença condenatória.

Art. 2.º – os integrantes do quadro efetivo de agentes de segurança socioeducativos poderão portar arma de fogo de propriedade particular e fora de serviço, desde que sejam:
I – submetidos a regime de dedicação exclusiva;    
II – sujeitos à formação funcional, com comprovação de capacidade técnica e aptidão psicológica;       
III – subordinados a mecanismos de fiscalização e de controle interno.

Art. 3º –Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Plenário Barbosa Lima Sobrinho, 31 de maio de 2016

Preocupado em aprofundar o foco na Educação visando uma ressocialização integral do indivíduo, o Degase criou o Projeto Pedagógico Institucional, e a Escola Socioeducativa Paulo Freire para dar capacitação pedagógica aos profissionais da instituição, além de confluir pesquisas acadêmicas multidisciplinares sobre as experiências do sistema socioeducativo no Brasil. Por outro lado, observadores do mundo inteiro emitem alertas sobre as violações constantes de direitos humanos nestas unidades.

A Comissão Interamericana dos Direitos Humanos (CIDH) da OEA, em comunicado à imprensa do dia 27 de junho de 2018, consternou preocupação profunda “com a violência incessante e as mortes nos centros socioeducativos para adolescentes em conflito com a lei penal” no Brasil. Para citar apenas um caso, no Rio de Janeiro, dia 24 de fevereiro, dois adolescentes morreram no Centro Educandário Santo Expedito, aparentemente como resultado de uma briga entre internos. A Defensoria Pública havia alertado desde 2005 sobre a precariedade das instalações e as condições de superlotação neste Centro capaz de receber no máximo 220 adolescentes, embora atualmente estar abrigando cerca de 538”.

Por outro lado, o PL nº 1.825/2016 arrola quase oito páginas (fonte 8), no item de abertura do projeto de lei, “Justificativa”, com casos de agentes socioeducativos mortos ou ameaçados por internos ou ex-internos, reivindicando a causa da “autodefesa” para o porte de arma. A arguição é repetir o quadro de combate ao crime organizado do sistema penitenciário para o socioeducativo, denunciar o controle das fações do tráfico dentro das unidades do Degase. Uma realidade que é constatável, mas converter o PL nº 1.825/2016 em vigência é ratificar a ordem militarizada estendida a instituições com finalidades alheias à segurança pública.

O esforço do PL nº 1.825/2016 observado dentro do seu corpo na “Justificativa” é converter o status socioeducativo em sistema carcerário. Apesar das dependências do Degase exercerem basicamente privação de liberdade, o ECA, no seu artigo 112, a define como, no inciso V, “internação em estabelecimento educacional”. Muito embora a realidade institucional contraste com as diretrizes do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente e do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), tendo em vista as inúmeras violações de direitos humanos denunciadas à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, a política a se adotar não pode ser no sentido de consolidar este estado de violações, aprofundando uma perspectiva regressiva de direitos. O esforço deve ser o de aproximar a realidade às leis nacionais e internacionais para o setor e não adequá-la ao sistema penal. Até porque o Código Penal define o piso etário para a maioridade. A conversão quase total do atual sistema socioeducativo ao status penal carcerário implica em profissionais embebidos psicologicamente da lógica punitiva de guerra e violações e de outro jovens massacrados e encurralados para o mundo do crime.

Mais especificamente, o PL nº 1.825/2016, na primeira linha da “Justificativa” agentes socioeducativos tornam-se em “agentes de segurança socioeducativos” integrados aos demais do “sistema de segurança pública estadual”. Este deslize semântico converte a uma corrupção jurídica. A referência é ao Estatuto do Desarmamento, ou Lei nº 10.826 de 2003, no seu Artigo 6º, Inciso VII, quando assegura o porte de arma a “agentes e guardas prisionais, os integrantes das escoltas de presos e as guardas portuárias”.

Vale aqui citar a Nota do Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, de 03 de outubro de 2018, contra a PL nº 1.825/2016: “a Advocacia Geral da União, em Parecer N° 153/2018-SEI/CONJUR/MDH/CGU/AGU, o qual dispôs sobre a incompatibilidade do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) com o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), é contundente em assinalar a natureza eminentemente pedagógica e protetiva das medidas socioeducativas”, como um sistema “de responsabilização de caráter eminentemente protetivo, em contraposição ao caráter eminentemente retributivo do sistema penitenciário”.  E ainda as “Regras das Nações Unidas para Proteção de Jovens Privados de Liberdade”, em seu Artigo nº 65, venda a posse e o porte de armas para o pessoal responsável por estabelecimentos de privação de liberdade juvenil.

Finalmente, e talvez o primeiro acinte legal é a evidente inconstitucionalidade, já que o inciso I do art. 22 da Constituição Federal, restringe a competência para legislar sobre armamentos e material bélico: “Compete privativamente à União legislar sobre: […] XXI – normas gerais de organização, efetivos, material bélico, garantias, convocação e mobilização das polícias militares e corpos de bombeiros militares”. Ou seja, não compete à ALERJ, em projeto de lei.

Antecedentes ao PL nº 1.825/2016, quanto à autorização ao porte de armas de fogo a guardas municipais, temos o PL nº 1.185/2012 no Distrito Federal (DF) que foi vetado, porém substituído pela Lei Distrital nº 4.963 de novembro de 2012 e igualmente teve inconstitucionalidade declarada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT). Mas em 2009, em Santa Catarina uma lei foi aprovada, a Lei Complementar Estadual de nº 472 e uma Ação Direta de Inconstitucionalidade foi ajuizada pela Procuradoria Geral da República contra, e aguarda o trâmite no Supremo Tribunal Federal.

Somam-se a dispositivos de armar agentes do estado, a questão dos Guardas Municipais. Após forte pressão dos governos municipais, a presidência da República decretou Lei nº 13.022 de 8 de agosto de 2014, que no seu Artigo 16, dispôs que “aos Guardas Municipais é autorizado o uso de armas de fogo, conforme previsto em Lei”. No Rio de Janeiro, entretanto, a Lei Orgânica do município não se adequou à norma ainda.

O PL nº 1.825/2016, publicado no Diário Oficial do Estado no dia 1º de junho de 2016, foi distribuída, primeiramente à Comissão de  Constituição e Justiça (CCJ) da Alerj. Aos 9 de novembro de 2017, o presidente da Comissão, deputado Luiz Paulo (PSDB) deferiu o PL com uma emenda modificativa vedando o uso de armas dos agentes no exercício da profissão.

Já a Comissão de Segurança Pública e Assuntos de Polícia, sob presidência da Martha Rocha (PDT),  aos 14 de dezembro de 2017, deu parecer favorável com emenda modificativa e outra aditiva referentes ao modelo do documento de identidade funcional dos agentes (Art. 1º, parágrafo único). A Comissão de Servidores Públicos igualmente aprovou com parecer  com emendas da Comissão anterior, de Segurança Pública, no dia 21 de dezembro de 2017.

Em março de 2018, o autor do Projeto de Lei, Marcos Muller (PHS), requereu ao plenário votação em Regime de Urgência, o que foi acatado pela Mesa Diretora em 26 de setembro do mesmo ano. Em sessão plenária do mesmo dia, representantes das Comissões de Saúde e a de Transporte deram parecer contrário ao Projeto de Lei nº 1.825/2016, nas vozes dos deputados Dr. Julianelli e Eliomar Coelho.

No dia 26 de setembro de 2018, passou-se em seguida à apresentação das emendas em plenário, no total foram 7 emendas. Primeira, Emenda 1, de Marcelo Freixo (PSOL), Eliomar Coelho (PSOL), Flávio Serafini (PSOL) e Wanderson Nogueira (PSOL), suprimindo o Artigo 2 sobre as prerrogativas para o porte de arma. A segunda, Emenda 2, igualmente supressiva porque reivindica a eliminação do Inciso IV do Artigo 1 que dispõe o porte de arma ao agente socioeducativo. A Emenda 3,Modificativa do Artigo 2, que, ao invés do porte de arma, deverão os agentes socioeducativos serem escoltados pela Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro conforme solicitada. A Emenda 4 suprime novamente, solicitando tirar o Inciso IV do Artigo 1. A Emenda 5 é aditiva ao Artigo 1, ao incluir na Lei nº 7.755 de 20/10/2017 os agentes de segurança socioeducativa do Degase. A Emenda6é supressiva por mais uma vez exigir a retirada do Artigo 2. E a sétima (7) emenda é supressiva também, novamente excluir o Inciso IV do Artigo 1.

 

Dia 10/04/2019: o bacalhau.

Em regime de urgência abrem-se os trabalhos da casa, sob a presidência do deputado André Ceciliano (PT) para a votação das emendas (acima) ao PL nº 1.825/2016. O deputado Márcio Pacheco (PSC), na ordem, apresenta substitutivo a algumas das emendas enquanto texto ou relatório final. Eis a surpresa da casa.

Márcio Machado defere a três emendas, a 2, 3 e 5, apresentando substitutivo a todas como subemendas. E contrário às demais, diga-se, as 1, 4, 6 e 7. Na subemenda à emenda número 2, acrescenta-se parágrafo ao Artigo 1º como a seguinte redação : “estende-se aos deputados estaduais no exercício ao mandato, à Polícia Legislativa, aos Auditores Fiscais de carreira do Estado e do Município o Direito a que trata o kaput deste artigo”. Subemenda nº 3, modifica-se o artigo nº 2 que passa a ter a seguinte redação: “os integrantes do quadro efetivo, os deputados estaduais, a Polícia Legislativa, e os Auditores Fiscais de carreira do Estado e dos Municípios poderão portar arma de fogo de propriedade particular fora de serviço, desde que sejam submetidos a regime de dedicação exclusiva, sujeito a formação funcional com comprovação de capacidade técnica e aptidão psicológica, subordinados a mecanismos de fiscalização interna”. Subemenda nº 5, inclua-se um Artigo com a seguinte redação: “Ficam incluídos no Artigo 1º da Lei 7.755, de 20/10/2017, os agentes de segurança socioeducativo do Degase, os deputados estaduais, a polícia legislativa e os auditores fiscais de carreira do Estado e do Município”.

Enfim, se o PL nº 1.825/2016 significa uma corrosão jurídica ao transgredir os contornos legais sobre a prerrogativa ao porte de arma no Brasil, agora o deputado Márcio Pacheco (PSC), ao estender o teor do projeto de Lei para pautas estranhas ao texto original, revelou uma aberração jurídica. Por terem que usar uma artimanha escusa para autorizar agentes do Estado ao porte de arma, de uma hora para outra, pareceu casuístico para uma configuração miliciana do Estado brasileiro. O deputado Luiz Paulo (PSDB), que foi presidente da CCJ no mandato legislativo anterior alardeou que o projeto de lei estava “cheio de bacalhau”. Acusou “uma inconstitucionalidade ao projeto original” e ainda o fato do Márcio Pacheco (PSC) ter feito uma emenda aditiva sobre uma suspensiva.

Apesar da denúncia de outros deputados, como Carlos Minc (PSB) que denominou o novo PL nº 1.825/2016 que emergia no plenário subitamente para as galerias que efusivamente manifestarem-se, de “manada de jabutis!”, e depois apelidou-o de “um guarda-chuva perfurado de balas para todos os lados”.

O deputado Flávio Serafini (PSOL), autor de uma das emendas pisoteadas pelo deputado Mário Pacheco, articulou pela retirada das emendas, já que estavam sendo corrompidas no seu todo. Porém o presidente da mesa, André Ceciliano (PT), atropelou mais uma vez, empurrando a votação e asfixiando a oposição.  Enquanto relator da Comissão de Educação, enfim deu parecer contrário ao novo texto da CCJ ao PL.

Renata Souza (PSOL) pela ordem, reivindicou a retirada de pauta do PL nº1.825/2016 para que ele retorne à Secretaria Geral da Mesa. Pois o tema tratado no projeto é pertinente à temática debatida na Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da ALERJ e o mesmo não  foi distribuído a esta Comissão. E acentuou: “o que está acontecendo aqui é um estelionato! Estão enganando a categoria com discurso oportunista que viola abertamente a Constituição Brasileira! Isso é um B-A-C-A-L-H-A-U !” .

Deputada Renata Souza (Psol)
DEPUTADA ESTADUAL DO PSOL, RENATA SOUZA, DENUNCIA ESTELIONATO DO GOLPE DO DEPUTADO MARCIO PACHECO. FONTE: SUELLEN LESSA.

A deputada Enfermeira Rejane (PCdoB) relevou a importância de debater a segurança dos profissionais do Degase mas que as emendas não passarão futuramente na CCJ da casa. Porque o parecer não seria condizente com a casa por trazer “algum prejuízo ao Executivo”. Por isso votou divergente ao parecer da CCJ.

Substituindo o deputado Dionísio Lins, Alexandre Knoplock (PSL) deferiu pelo Márcio Pacheco: “os agentes do Degase transportam marginais e merecem sim o porte de arma e o meu voto é favorável ao parecer da CCJ”.

Waldeck Carneiro (PT) sintetizou o drama do sistema socioeducativo:

“nas condições em que funcionam, o sistema socioeducativo do Rio de Janeiro simplesmente é uma farsa! Ele não acontece! Não estamos conseguindo nem socializar nem educar esses menores adolescentes em conflito com a Lei”.

“Nós não estamos no campo da segurança pública aqui nem no campo do Direito Penal. Estamos no campo da Educação. A superlotação é o drama deste sistema. A desvalorização destes profissionais que fazem o trabalho difícil e que não têm nem salários nem carreiras compatíveis com essa complexidade. A gente não tem as escolas dignificadas dentro do sistema socioeducativo. E estamos passando longe da solução destes problemas. Não será com o porte de armas a solução.”

Serafini completou: “É importante ressaltar alguns aspectos do sistema socioeducativo. Hoje, aqui no Estado do Rio de Janeiro,

“nas dependências do DEGASE, a superlotação chega a mais de 200%. Isto torna o ambiente tanto para os agentes socioeducativos como para os internos, num ambiente absolutamente insuportável.”

Tanto para os agentes como para os adolescentes. Menos de 30% dos adolescentes internados no DEGASE hoje conseguem estudar. A política socioeducativa no Estado do Rio de Janeiro está completamente contrária aos seus objetivos porque falta a garantia dos direitos dos adolescentes e dos trabalhadores.”

Enquanto os parlamentares se postavam ao plenário em discursos inflamados, as votações corriam concomitantemente. O resultado era visivelmente estimado, enquanto o miolo conservador se aglutinava como uma manada à direita do presidente da mesa, André Ceciliano (PT), os grupo de deputados militantes resistiam sem resignação. No placar eletrônico à direita, na altura das galerias, via-se o resultado em vermelho: 44 votos deferindo o substutivo do deputado Márcio Pacheco contra 11 dos opositores que votaram divergente. Enfim, foi estendido não apenas o sentido de segurança pública ao DEGASE, como o porte de armas para Deputados Estaduais, Auditores Fiscais de carreira no Estado e no Município do Rio de Janeiro, e as Polícias Legislativas.

E pela emenda nº 5, que compôs o substituto do deputado estadual Márcio Pacheco, incluiu as categorias dos Deputados Estaduais, Auditores Fiscais de carreira do Estado e do Município do Rio de Janeiro, Polícias Legislativas e, enfim, quase coadjuvante na altura do campeonato, os agentes socioeducativos do DEGASE nas categorias incluídas na Lei nº7.755 de 20 de novembro de 2017, a não pagarem contribuição ao Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços (ICMS) para aquisição de armas de fogo. E ainda não querem pagar imposto !

O PL nº1.825/2016 ficaria assim:

PROJETO DE LEI Nº 1825/2016

EMENTA:

DISPÕE SOBRE O PORTE DE ARMA DE FOGO PARA OS AGENTES DE SEGURANÇA SOCIOEDUCATIVOS DO DEPARTAMENTO GERAL DE AÇÕES SOCIOEDUCATIVAS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

Autor(es): Deputado MARCOS MULLER

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

RESOLVE:

Art. 1º – Os Agentes de Segurança Socioeducativos, ativos e inativos, gozarão das seguintes prerrogativas, entre outras estabelecidas na legislação federal:
I – ser portador de documento de identidade funcional com validade em todo território nacional e padronizado na forma da legislação pertinente;
II – ser recolhido em prisão especial, à disposição da autoridade competente, até o trânsito em julgado de sentença condenatória, e, em qualquer situação, separado dos demais presos;
III – ter prioridade nos serviços de transporte, saúde e comunicação, públicos e privados quando em cumprimento de missão;
IV – ter porte de arma, categoria defesa pessoal, em ambiente fora do âmbito do sistema de atendimento ao adolescente infrator.

Parágrafo1 – Não havendo estabelecimento específico para o preso nas condições do inciso II dessa legislação, os Agentes Socioeducativos serão recolhidos em dependência distinta dos demais presos no mesmo estabelecimento, a ser designada pela autoridade competente, por orientação da Secretaria de Administração Penitenciária, até o trânsito em julgado da sentença condenatória.

Parágrafo2-  Estende-se aos deputados estaduais no exercício ao mandato, à Polícia Legislativa, aos Auditores Fiscais de carreira do Estado e do Município o Direito a que trata o caput deste artigo.

Art. 2.º – Os integrantes do quadro efetivo de segurança socioeducativos, os deputados estaduais, a Polícia Legislativa, e os Auditores Fiscais de carreira do Estado e dos Municípios poderão portar arma de fogo de propriedade particular fora de serviço, desde que
I – submetidos a regime de dedicação exclusiva;
II – sujeitos à formação funcional, com comprovação de capacidade técnica e aptidão psicológica;
III – subordinados a mecanismos de fiscalização e de controle interno.

Art. 3º – Ficam incluídos no Artigo 1º da Lei 7.755, de 20/10/2017, os agentes de segurança socioeducativo do Degase, os deputados estaduais, a polícia legislativa e os auditores fiscais de carreira do Estado e do Município.

Art. 4º –Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Plenário Barbosa Lima Sobrinho, 10 de Abril de 2019.

Bom, agora o trâmite que se segue serão 20 dias para a sanção ou não do governador Wilson Witzel. E pela familiaridade da turma que fez o escarcéu na sessão plenária ordinária do dia 10 de abril, para com o ex-juiz, já sabemos o resultado. Enquanto isso, os deputados estaduais poderão portar armas no exercício do mandato. E quando Alexandre Knoploch (PSL) e Rodrigo Amorim (PSL) forem à Aldeia Maracanã, irão montados. O Estado brasileiro, não bastassem os capitães do mato, persistem a ostentar poder colonialista.

ORDEM DO DIA
AGENTES SOCIOEDUCATIVOS CELEBRAM VOTAÇÃO DO PL Nº 1.825/2016. FONTE: THIAGO LONTRA.

Nesta sexta-feira, 12 de abril, o PL nº 1.825/2016 seria publicado no Diário Oficial do Estado em conformidade com as alterações acima descritas, para apreciação do governado Wilson Witzel. Porém, prontamente no dia 11 de abril, em ofício (nº 83/2019) endereçado ao governador Witzel, emitido pela 7ª Câmara de Coordenação e Revisão (Controle Externo de Atividade Policial e Sistema Prisional) da Procuradoria Geral da República (PGR), órgão que compõe o Ministério Público Federal (MPF), o Suprocurador-Geral Domingos Sávio Dresch da Silveira solicitou o veto integral do projeto de lei supracitado. Ele lembrou o caso de Santa Catarina (citado neste artigo acima) ainda em trâmite no STF sob Ação Direta de Inconstitucionalidade a pedido justamente da PGR em 2009. Sublinhou sobretudo ampliação do rol de autorização ao porte de armas de fogo, taxativamente estabelecido no artigo 6º da Lei nº 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento), que não pode ser alterado por lei estadual. E mais uma vez denunciou a inconstitucionalidade frente ao disposto no Artigo 22, incisos I e XXI da Constituição Federal. Finaliza frisando a posição do STF sobre o julgamento da ADI 3.112/DF e a ADI 3.528/RO.

Afortunadamente, e antes do envio da assessoria legislativa da casa ao governador, o deputado André Ceciliando (PT), presidente da mesa, atendeu as solicitações do deputado Luiz Paulo (PSDB) de suspensão da tramitação. Pelo descrito nesta matéria sobre o ocorrido na sessão plenária ordinária do dia 10 de abril, as irregularidades são evidentes. Luiz Paulo denunciou irregularidade do parecer do deputado Márcio Pacheco (PSC) reivindicando representar a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), quando no dia 5 deste mês a CCJ já havia dado parecer definitivo.
Em nota oficial da Alerj, no dia 11 de abril o presidente da casa, André Ceciliano (PT) “informou na tarde da última quinta-feira (11/04) que suspendeu a tramitação do projeto de lei 1.825/16, que trata do porte de armas para agentes do Degase e outras categorias”. Assim, o projeto volta à Mesa Diretora da Alerj, depois de ser analisado pela Procuradoria da Casa.

Enfim, estamos a depender do bom uso do Direito, da legalidade e do senso republicano de conter a propensão de ampliar a perspectiva penal e a força de repressão do Estado, num momento em que ganham ascensão blocos políticos que respaldam modelos de exceção e militarizados. E da parte que nos toca, acionemos a mobilização de atores e organizações a pressionar a casa legislativa. Partidos de esquerda e organizações sociais como o Movimento pelo Desencarceramento já anunciaram fortalecer o ‘advocacy’ junto a parlamentares e o Ministério Público. Revertamos a direção desta nau, e que desmantelemos o navio negreiro.