Zé Celso, o revolucionário do teatro brasileiro

FOTO: Instragram Oficina
Palco passarela do Teatro Oficina e sua plateia arquibancada. FOTO: Nelson Kon

O fundador do Teatro Oficina Uzyna Uzona e promotor da linguagem antropofágica do teatro brasileiro faleceu na manhã de ontem, aos 86 anos, no Hospital das Clínicas, em São Paulo, após um incêndio em seu apartamento que atingiu 53% de seu corpo.

Uma das maiores referências do teatro nacional, Zé Celso saiu de Araraquara, cidade natal no interior paulista, para cursar Direito na USP, mas nunca exerceu a profissão.

Foi durante os anos de faculdade que floresceu seu amor pelo teatro e quando escreveu sua primeira peça, Vento Forte para Papagaio Subir, em 1958. No mesmo ano, fundou, junto de Renato Borghi, o Teatro Oficina.

Já em seus primeiros anos, o Oficina chamou a atenção do público adotando um palco em passarela com a plateia disposta em arquibancadas laterais. A estrutura rompeu com a herança do tradicional teatro grego e seus palcos elisabetanos, retangulares e projetados em direção à plateia.

Teatro Oficina e a Ditadura Militar

A arquitetura do teatro, desde seu nascimento na Rua Jaceguai, 520, bairro do Bixiga, não era a única revolução artística proposta pelo Oficina. Ele incomodou o Estado durante a Ditadura Militar por fazer do palco um espaço de protesto contra as injustiças e alienações.

O local foi incendiado pelo Comando de Caça aos Comunistas (CCC), grupo de extrema-direita que teve apoio de diversos setores sociais durante a Ditadura. Com ações violentas, justificavam crimes alegando a defesa do Brasil contra o comunismo.

Após a reinauguração do Oficina, o grupo fez grande sucesso com a montagem de Rei da Vela, de Oswald de Andrade, criando o teatro antropofágico.

Essa linguagem, que o guia até hoje, propõe a criação de obras verdadeiramente brasileiras, partindo da análise crítica do modelo europeu imposto na época.

Com a proibição da peça Roda Viva, de Chico Buarque, em 1968, os integrantes do Oficina passaram a ser cada vez mais perseguidos pelos militares. Muitos foram presos e torturados, incluindo Zé Celso que, após 20 dias de cárcere, em 1974, se exilou em Portugal, voltando ao Brasil quatro anos depois.

EVOÉ, Zé!

Evoé”, grito de alegria criado pelos gregos antigos para evocar Dionísio, deus do vinho e do teatro, é bradado até hoje como saudação entre atores, chamando boas energias aos palcos. 

A partir dessa saudação, peço licença ao jornalismo tradicional para finalizar esse texto com palavras que vem do meu coração e com rebento se liquefazem em meus olhos enlutados.

Conheci Zé Celso em 2017, durante uma aula de história da arte brasileira no curso de Teatro da Escola Técnica de São Paulo. Ali, aos 18 anos recentemente feitos, me vi diante de sua magnitude, delicadeza e potência artística.

Imersa em sua luta a partir do teatro manifesto, tracei meu caminho: fazer da minha voz a denúncia das realidades de um país desigual. Foi com esse sonho que me tornei atriz e, anos depois, me encontrei no jornalismo.

O dramaturgo dizia que aquele vento que inspirou sua primeira peça o levou ao teatro. Digo que o vendaval de Zé Celso me trouxe até aqui. Obrigada, Zé. EVOÉ!

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