Votos de 58 milhões se desmancham sob o calor das vaidades

58 milhões de votos na reeleição viram moeda sem valor

O presidente da república não dá sinais de ter desistido da luta, mas às vezes solta uma anedota que o público recebe com um sorriso amarelo e olhar desconfiado treinado desde o primeiro dia de 2019. Agora sua excelência quer que o TSE anule nada menos de 250 mil urnas, representando mais da metade do total usado nos dois turnos das eleições. O PL, que subscreve o pedido ao ministro Alexandre de Morais, insiste na possibilidade de fraude improvável e, uma vez aceita, a anulação tiraria mais de 20 milhões de votos do total de cada um dos dois candidatos, mas não é aí que a porca torce o rabo; a questão é a esperteza dos liberais ao cancelar as urnas só no segundo turno, como se as falhas apontadas não estivesse desde o começo do processo eleitoral.

A bancada do PL tomará posse no ano que vem com 99 integrantes, ou seja, uma demonstração de força eleitoral de Bolsonaro, que ainda alavancou a eleição ao Senado de Damares Alves, Marcos Pontes e o incrível Hamilton Mourão – este derrotando Olívio Dutra, histórico personagem do PT no Rio Grande do Sul – entre outros. A onda bolsonarista nas urnas vem de 2018, quando elegeu Eduardo, o 02, com 1,84 milhão de votos, mas este ano perdeu mais da metade e emplacou 741 mil votos. Nesse contexto, a implicância de Jair Bolsonaro apenas reforça a personalidade narcisista e egocêntrica que o país conhece: danem-se todos vocês, eu que não vou perder isso aí, talkei?

É um extraordinário capital de 58 milhões de votos no segundo turno o que Jair Bolsonaro está sangrando em plena praça à vista de todos e para desespero do presidente do Partido Liberal, Waldemar da Costa Neto. Qualquer político com algum senso de oportunidade se agarraria a esse capital para alicerçar seu futuro e o do partido. Mas Jair é uma figura singular na nossa cena política, foi deputado federal pelo Rio de Janeiro entre 1991 e a eleição presidencial de 2018. Nunca, jamais, em tempo algum, perdeu eleição, à exceção desta. Garoto mimado e com pendores militaristas , não aceita perder e quer melar o jogo a todo custo.

Waldemar, bandido velho, acusado pela ex-mulher até de tráfico de drogas e por isso preso no Mensalão, é gato escaldado. Não deixará escapar a oportunidade única de comandar quase um quinto da Câmara por caprichos de um Severino Cavalcanti de olho azul. Ele que se dane! O PL já ofereceu casa alugada, cargo importante e salário à altura, gabinete na sede em Brasília, secretária, carro com motorista e ar condicionado para os dias de calor, tudo para ele ficar quieto no seu canto. Até assessoria jurídica total nos processos que vão pipocar pela país estará assegurada.

Mas o presidente ignora e faz beicinho a tudo isso, ele quer porque quer ganhar do Lula e vai criar e inventar e espalhar todo tipo de mentira, vai usar e abusar dos instrumentos do estado sob seu comando e vai explorar até o affair Michele e Waldemar para acusar a esquerda e posar de vítima. O presidente do PL está de saco cheio, diga-se, e ameaça até debandar para a base de apoio de Lula. Não é provável, dada a indesejada companhia do PL entre os aliados, mas nada é impossível; e Jair ficaria pendurado na brocha, coisa que ele entende de sobra.