Rio pela janela

Já se tornou comum falar que o Rio de Janeiro está de braços abertos para receber todos que decidam conhecer esse estado maravilhoso. Porém, está de braços abertos para o mundo e de costas para o seu povo.

O cenário, palco de grandes eventos, está em construção, tira-se o “lixo” urbano, faz-se um cinturão de contenção, com diria Slavoj Zizek: “as novas formas de apartheid, os novos muros e as favelas”, tudo é feito para que a transmissão em TV digital esteja perfeita e não mostre “os pés de galinha” do rosto de nosso estado.

 As vias de trânsito ganham muros, ou telas, com desenhos, que maquiam a realidade das casas humildes, enquanto isso, doentes morrem sem leitos suficientes nos hospitais com suas pinturas sóbrias e mediavais, fazendo dos médicos artistas.

Certamente, os hospitais a serem reformados para os grandes eventos, serão os que circundam os espaços freqüentados por turistas.

Ademais, o Sociólogo Anthony Giddens, em seu livro “Sociologia”, lembra da teoria “das janelas quebradas”, segundo esta teoria há uma conexão direta entre a aparência de desordem e o crime efetivo. Tal teoria abre espaço para os programas de tolerância zero aplicados pela polícia, e uma das críticas, é justamente deixar a critério dos policiais a identificação da desordem, nesse momento, invoca-se Cesare Lombroso e sua assombrosa teoria, adaptada à realidade tupiniquim, com a verificação da deformidade do bolso.

Portanto, Não há espaço no Rio para os que vivem à margem, proíbem-se festas de aniversários nas favelas, controlam-se movimentos culturais do “Silva” pobre, assim como era feito com o samba, o importante é que tudo tenha a aparência de lugar paradisíaco.

Exalta-se, ainda, o pandeiro da mulata, o teleférico periférico, o zoológico humano e o turismo feito como um safári em favelas.

No entanto, o passista está sempre sorrindo, pois em sua vida o valor é a ginga, o molejo, e a Lua que ilumina com alegria a simples felicidade.

Por tudo isso, é de se contemplar o maravilhoso cenário do pobre carioca com sua rica alma ferida, enjaulado, cercado por barras de ferro invisíveis, pelo medo, pelo cerceamento do direito de se divertir, sendo recolhido como uma célula cancerígena.

E para não perder a oportunidade, vendem-se bonecos de super-homens! Os espectadores aplaudem mais um filme de terror humanitário, e todo mundo vai dormir feliz, sonhando com o trânsito caótico e a próxima vitória no apertado estádio de futebol.

Para finalizar, cito o poeta: “Brasil, mostra a sua cara!”, mas sem maquiagem é melhor! Que se mude a realidade, que se combata a causa, para não se obrigar a aniquilar os efeitos. Que se revolucione democraticamente a Justiça, como propõe Boaventura Souza Santos, que se revolucione a educação trazendo de volta a concepção de Darcy Ribeiro, que se construa um programa amplo e eficaz de saúde da família. Que se respeite, realmente, o princípio constitucional de Dignidade da Pessoa Humana.

Leandro da Silva Martinho

Estudante e estagiário de Direito, 7º período PUC-RIo.