Projeto de artista da Rocinha conscientiza crianças através da arte

Bianca Sartes e crianças em painel criado pelo projeto. Créditos: Reprodução Instagram @povoada.art
Povoada é um projeto social voltado para crianças e situado nas favelas da Zona Sul do Rio
Crianças acolhidas pelo projeto realizando uma oficina no projeto. Créditos: Arquivo Pessoal: Bianca Sartes.

Povoada é um projeto sem fins lucrativos idealizado pela artista Bianca Sartes, 33 anos, moradora da Rocinha, e é realizado em favelas da Zona Sul do Rio de Janeiro. O projeto conta com oficinas de artes visuais, de diversas áreas, com crianças e o intuito é conscientizar e educá-las. Segundo a artista, “O maior interesse é contribuir pra a vida dessas crianças, de maneira que possa salvar a vida delas.”

Para Bianca, o significado do nome “Povoada” diz respeito à coletividade. “É de não estamos só. É pra estimular isso de trabalharmos juntos. Somos um, mas não estamos só, sabe? Povoada vem disso, de você ocupar o lugar onde você está, de tomar posse, de se posicionar.” Ela relaciona o nome do projeto com uma música de mesmo nome, da cantora Sued Nunes. 

O projeto enfrenta dificuldades para se manter, entre elas, não ter um lugar para que as oficinas aconteçam, não ter uma sede. Mas apesar das adversidades, o povoada já completou a duração de um ano e meio. “Só a oportunidade de eu ter apresentado pra as crianças a arte como opção e ter as conscientizado sobre as situações ao redor delas, sobre o perigo e coisas que elas nem imaginavam, pra mim isso é uma conquista muito grande. Ter conseguido espaços voluntários também foi muito importante pra mim.”

Bianca conheceu a arte quando criança, mesmo tendo tido uma alfabetização tardia, por conta de negligência e abusos familiares. “Por volta dos meus nove anos, eu tenho essa lembrança. Eu sempre fui uma criança muito interessada, muito questionadora e muito conversadora, conversava e questionava tudo. Minha mãe tava conversando com uma pessoa, conversa de adulto, e eu me intrometi, e ela fez um desenho no papel, uma casa com árvore e mandou eu terminar o desenho. Desde então eu tô terminando esse desenho, né. Eu tô desenhando.“ 

A arte foi de extrema importância na sua infância e adolescência para lidar com as questões que enfrentava. “Eu acabei tendo depressão, por conta de todo um histórico traumático que eu tive na minha infância, no qual eu não tive direito aos estudos, por que a minha mãe só deixou eu entrar na escola com 11 anos de idade. Eu não tinha consciência das reais coisas que estavam acontecendo comigo, dos meus direitos, e de tudo o que tava acontecendo comigo dentro da minha casa. A arte foi a forma que eu consegui me expressar nessa sociedade.”

Apesar da importância da arte na sua vida, ela conta que durante muito tempo teve que esconder seus talentos, por conta de desmotivações e comentários preconceituosos que ouvia. “Eu rejeitei durante muito tempo essa minha posição artística. Eu cresci ouvindo falar que artista era drogado, que não tinha o que fazer, que era ‘hippie’. E isso de maneira negativa e pejorativa. Então eu tentei me enquadrar em outros padrões.”

Ela teve diversas outras profissões para sobreviver, mas sempre sentia a falta de se expressar através da arte. “Agora eu pinto, desenho, faço desenhos digitais, faço tatuagem.  Eu sou autônoma. Hoje em dia eu não tenho mais aquela preocupação inicial que eu tinha quando mais jovem, de precisar me manter nos padrões da sociedade.”

Para finalizar, a propulsora do projeto atenta para o papel educador da arte. “A arte não tem barreiras, classe social, gênero, a arte não tem o que a impeça de acontecer, né? A arte traz o ser humano à vida. Em toda a história do ser humano, você vê a arte como uma forma de expressão de conhecimento, de engrandecimento do indivíduo. Isso você pode observar em todas as áreas. A educação artística, a arte como forma de educação, ela é primordial porque ela acessa a todos. Por isso que eu uso a arte como forma de conscientizar as crianças, porque ela não pergunta da onde você vem, quem você é, ela apenas faz acontecer. E ela é necessária, então eu acredito na arte como forma de resistência e educação.”