Prêmio Mestre das Periferias 2018

Conceição Evaristo é uma das premiadas. Foto: Reprodução Internet

Rio de Janeiro – O Conjunto de Favelas da Maré será palco de uma premiação internacional: Mestre das Periferias. A escritora internacionalmente premiada Conceição Evaristo, o líder indígena Ailton Krenak, o líder quilombola Antonio Nêgo Bispo e a socióloga, defensora dos direitos humanos e vereadora do Rio de Janeiro Marielle Franco (em memória), serão as pessoas homenageadas pelo Instituto Maria e João Aleixo. O prêmio é uma iniciativa que tem como objetivo estimular e promover a produção de conteúdos sobre as periferias e os seus criadores, fortalecendo uma perspectiva que enxerga favelas, quilombos, aldeias e os vários espaços populares enquanto territórios potentes, indo na contramão da visão hegemônica, que apresenta tais ambientes enquanto locais marcados pela carência, violência e dor.

A premiação acontece na quarta-feira, 08 de agosto, a partir das 18h, no Galpão Bela Maré, ao final do primeiro dia do Fórum Brasileiro de Direitos Culturais – Territórios Inventivos das Periferias, evento que também acontecerá na Maré e irá discutir a Cultura enquanto meio de dinamizar e ampliar economias diversas das periferias. A programação do prêmio Mestre das Periferias conta com uma Roda de Conversa com as pessoas premiadas e uma homenagem à Marielle Franco, moradora da Maré, Vereadora, assassinada neste ano. No encerramento, a DJ Tammy comanda a pick-up com seu line-up de música preta. Oriunda do Viaduto de Madureira, a DJ realiza um trabalho de resgate da black music e da discotecagem na vida noturna do Rio de Janeiro e Brasil. Sua apresentação será acompanhada de um coquetel.

Esta é a primeira edição do Mestre das Periferias, um prêmio que será anual, sempre homenageando pessoas cuja trajetória, práxis e múltiplas produções colaboram para conquistar olhares e construir ações que ampliem a potência das periferias.

“Consideramos que o racismo estrutural e institucional é algo que dificulta o acesso e a inserção de grupos sociais historicamente marginalizados aos espaços de poder. Pessoas que se parecem com Marielle, Krenak, Bispo e Conceição Evaristo, não apenas fisicamente, mas na história de vida, construção acadêmica e profissional e militância  dificilmente são premiados em eventos dessa magnitude, como o que estamos propondo, por terem seus saberes não reconhecidos por estarem fora da ideologia hegemônica e deturpada sobre a periferia. O prêmio Mestre das Periferias se apresenta como mais um elemento de subversão da lógica e do olhar do senso comum sobre territórios periféricos e a produção do conhecimento nestes espaços. Reafirmando que a periferia, além de ser uma área do saber sobre a qual muito se produz, é ela mesma um lugar de produção de saberes pulsantes, de onde surgem mestres todos os dias com suas próprias narrativas e linguagens”, aponta Ivana Dorali, jornalista do Instituto Maria e João Aleixo.

Os Mestres receberão uma bolsa de R$30.000,00 para incentivo à pesquisa e produção de conteúdo. Em parceria com o Instituto Maria e João Aleixo, Evaristo, Krenak e Bispo irão produzir conteúdos para a Revista PERIFERIAS (www.revistaperiferias.org.br), que também é uma produção do Instituto. Participarão de um minidocumentário sobre as suas trajetórias, o que deverá culminar na apresentação dos principais conceitos e contribuições de cada Mestre das Periferias; além de mediar um ciclo de debates aberto ao público para discutir questões de relevância para as periferias.

Conheça os premiados:

Ailton Krenak:

É cidadão Krenak, nascido na região do Médio Rio Doce em Minas Gerais. Durante os anos 70 atuou como produtor gráfico e jornalista. Nos anos 80 alcançou papel de destaque com a criação do Núcleo de Cultura Indígena e com a sua intervenção decisiva na Constituinte de 1988, defendendo a garantia dos direitos dos povos originários. Em sua caminhada extensa e plural como militante e intelectual, publicou textos relevantes, criou instituições centrais na luta das etnias originárias, nas causas ambientais, protagonizou documentários e foi assessor especial de políticas indígenas em Minas Gerais. Leciona na Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF desde 2016, ano em que foi laureado com o título de doutor Honoris Causa. A partir de sua atuação, a luta indígena foi capaz de disputar seu status simbólico de condição de sujeito pleno de direitos históricos e, assim, conectar-se à rede intercontinental de povos e organizações que defendem a potência do sujeito coletivo indígena. É uma das maiores lideranças dos povos originários do Brasil e América Latina.

Antonio Nêgo Bispo:

Antonio Bispo dos Santos, ou Nêgo Bispo, nasceu no Vale do Rio Berlengas (PI), criou-se no Quilombo Saco-Curtume (São João do Piauí/PI) e construiu em sua trajetória uma relevante atuação a partir de sua territorialidade, ancestralidade e cosmovisão quilombola. Lavrador; poeta; escritor; intelectual; ativista; militante; professor convidado em universidades; documentarista; liderança quilombola ou, como prefere ser chamado, um ‘relator dos saberes’. A partir de sua produção intelectual e militância política, desenvolveu não só uma crítica consistente ao modelo de sociedade imposta aos povos negros e indígenas e demais populações de periferia, mas também procurou trazer à luz o longo histórico de luta das populações subalternizadas em sua busca por estabelecer outros paradigmas de pensar e viver, para além dos modelos hegemônicos.

Conceição Evaristo:

Mineira da periferia de Belo Horizonte, mudou-se para o Rio de Janeiro em 1971, onde estudou letras na Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ e iniciou sua militância no Movimento Negro. É Mestra em Literatura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-RIO e Doutora em Literatura Comparada pela Universidade Federal Fluminense – UFF. Criou uma nova forma de escrever na Literatura, a escrevivência, com a qual partiu de suas experiências de vida como mulher negra para formar a base de suas obras. Publicou suas primeiras obras em 1990, na série Cadernos Negros, promovida pelo Coletivo Cultural e Editora paulista Quilombhoje. É autora dos livros Ponciá Vicêncio (2003), Becos da Memória (2006), Poemas de recordação e outros movimentos (2008), Insubmissas Lágrimas de Mulheres (2011), Olhos D’Água (2014) e Histórias de leves enganos e parecenças (2016). Foi tema da Ocupação Itaú Cultural, em 2017, realizada no Centro de Artes da Maré – CAM, Maré – Rio de Janeiro. Vencedora dos prêmios Jabuti de Literatura de 2015, na categoria Contos e Crônicas, por Olhos D’Água; Faz a Diferença – Categoria Prosa, de 2017; Prêmio Cláudia – Categoria Cultura, de 2017; Prêmio de Literatura do Governo do Estado de Minas Gerais, em 2017; e o prêmio Bravo como Destaque também em 2017.

Marielle Franco (em memória):

É cria da Maré, onde passou sua infância e juventude e iniciou sua militância em defesa da Favela. Formou-se em Sociologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-RIO. Fez mestrado em Administração pela Universidade Federal Fluminense – UFF, tendo como tema de sua dissertação: UPP: a Redução da Favela a Três Letras”. A partir de 2006, atuou em diversas iniciativas direcionadas ao Conjunto de Favelas da Maré e na Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados do Rio de Janeiro – ALERJ, representando o mandato do Deputado Estadual Marcelo Freixo – PSOL RJ. Em 2016, foi a quinta candidata mais votada no município, elegendo-se vereadora. Assumiu a coordenação da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, onde atuou até ser assassinada em março de 2018.