Ocupação na reitoria da UFRJ em 1998: memória de luta pela educação

Foto: Willian de Moura

Era mais uma manhã na Baixada Fluminense, minha mãe já estava trabalhando há horas, eu ainda estava acordando e ligando a TV para ver as primeiras noticias do dia. No telejornal da Globo uma notícia urgente era dada, a Reitoria da UFRJ estava sendo ocupada por alunos e funcionários que barraram a posse do Reitor Vilhena, que era um interventor do Governo FHC, desrespeitando o processo democrático de escolha do Reitor pela comunidade acadêmica.

Eu estava tomando café da manhã quando percebi, atrás do repórter que estava ao vivo, que passava um grupo de pessoas conhecidas. Eram professores e alunos do Pré-Vestibular para negros e carentes do núcleo da Igreja Nossa Senhora da Aparecida.

Uma onda de energia e inspiração tomaram minha mente e logo coloquei um uniforme escolar e parti de ônibus até o Fundão. Chegando lá eu não conhecia nada, fui pelo instinto, no caminho dentro do Campus até ajudei a guiar um grupo que estava perdido, e foi com eles que cheguei até a Reitoria.

A cena era de filme da época da Ditadura, todos dispostos a tudo para manter os direitos democráticos e a educação pública de qualidade para todos. Eu tinha apenas 17 anos e ainda estava iniciando o ensino-médio. Um homem filiado ao PT me perguntou se eu era da Ubes – União dos Estudantes secundaristas, eu respondi não.  Sou do STRESS!

O Cara do PT ficou muito “bolado” e logo perguntou: “Você é anarquista? Se for não pode fazer bagunça, aqui é coisa séria”. Antes que eu pudesse responder chegaram os amigos que ví na televisão, eram todos considerados de longas lutas e mobilizações. Por isso, fui liberado da “dura” ideológica, mais fiquei sob observação da comissão de segurança da ocupação, que depois de desenrolar com as lideranças sobre minha participação no ato, foi permitida minha estada que durou por mais um mês, entre idas e vindas.

O STRESS era uma organização autônoma que nasceu em Deodoro ao som da Banda punk  Repressão Social, no extinto Bar da Rosa, aonde todos os domingos se reuniam a juventude undergroud da Baixada-Fluminense, Zona-Norte e Zona-Oeste. Às margens da Avenida Brasil em frente ao Conjunto do Moquiço. O grupo era composto por militantes de diferentes linhas de pensamento dentro do campo da esquerda popular. Tanto que parte do grupo aderiu a Resistência Popular, uma federação libertária de base.

Na Ocupação da Reitoria conheci muitos professores universitários, profissionais liberais, políticos e artistas importantes e famosos de nossa sociedade, ainda quando eram estudantes e estavam em uma luta que a cada dia parecia mais possível. Entre discursos, informes e reuniões tive uma imersão na luta de classes pela educação superior. Pois a luta pela Universidade Pública reflete em toda a sociedade, principalmente, por ser uma ferramenta de transformação social que pode levar a melhoria da vida do povo.

A Ocupação da Reitoria da UFRJ fez parte do meu aprendizado político. Nessa época a luta mais significativa foram os protestos contra a privatização da Vale do Rio Doce, que hoje percebemos o grande erro que foi em valores não arrecadados pelo lucro da companhia como pelos desastres ambientais e centenas de mortes causadas pela administração da empresa privatizada.

Na UFRJ enquanto não havia as assembléias, ou resistência contra a polícia. Tínhamos missões para manter a ocupação, como limpar toda a Reitoria e cozinhar para o coletivo, além das comissões que mantinham a organização total da ocupação. Não tinha internet e a mídia de massa era apenas o rádio e a tv.

Um dos momentos mais emocionantes foi quando encontrei minha professora de teatro deitada dormindo no chão. Depois tomamos uma chá do bom e fui apresentado a muitas atrizes e atores que estudavam na UniRio e depois desse momento de descontração chegou o dia da desocupação. Era uma guerra de liminares, até que o Governo ganhou e a Polícia Federam com apoio da PM forçou a desocupação do prédio.

Foi um lindo ato que jamais esquecerei! Entre as músicas cantadas teve a Internacional Socialista, porém a que mais emocionava era o grito: “Você aí parado também é um explorado!” . Uma provocação na sensibilidade dos policiais alí envolvidos. Tudo ocorreu bem, sem violência, nós saímos vitoriosos e vibrantes rumo a próxima batalha pelo Fora FHC e Fora FMI!

Todo Poder ao Povo! Por uma educação laica, plural e de qualidade para todos! Viva o STRESS!

Dedico deste arquivo a todos que viveram esse momento de nossa história.