“É do tempero da Juju que eles gostam”

Conheça um pouco da história de Juraci Vilela, que dá nome e alma ao famoso Bar da Jura, no Morro da Providência.

foto: divulgação

Nascida em Pernambuco, Juraci Vilela, a Dona Jura, veio para o Rio de Janeiro com 3 anos para ficar com os parentes de sua mãe, no Morro da Providência. Lá era para onde sua mãe “fugia” quando brigava com seu marido.
Junto dela, vinha os dois filhos, que pegavam estrada de barro, com muita poeira, ônibus sem banheiro, que atolava quando chovia e de noite paravam para dormir nas hospedarias da estrada.

Na época, ainda não existia whatsapp, e-mail ou outros meios mais instantâneos de comunicação e Maria Edite e seu marido João se correspondiam por cartas. Vira e mexe ela vinha para o Rio, e ele em seguida vinha buscá-la.

Entre indas e vindas, a mãe voltou grávida de seu irmão, e ganhou uma passagem de navio para retornar ao Nordeste. Em 1968 seu pai faleceu, e com 13 anos voltaram ao Rio de Janeiro e aqui ficaram. Foram morar na casa da avó, em Belford Roxo, e em 1971 voltou para Providência, onde se casou e fincou suas raízes.
Em 1982 seu marido foi assassinado e após, um dos filhos que teve, também foi morto pela mão da polícia. Hoje em dia, porém, Dona Jura com toda sua garra e vontade de viver está novamente casada, com uma filha, seis netos e uma bisneta.

Durante o governo de Marcelo Alencar, houve o projeto pró saneamento básico Prosanear, e Juraci foi convidada a fornecer comida para todos que trabalhavam nas obras, fornecendo cerca de 150 refeições por dia. Esse foi um grande pontapé, que a fez começar a se planejar e aos pouquinhos conseguiu abrir um pequeno negócio. A produção era toda feita em casa e servida em sua varanda. “Comecei com o que tinha, fiz obras e também dívidas, porque não tinha crédito. Isso fez com que eu tivesse que voltar a trabalhar em casa de família”, conta. Mas após alguns anos e com todas as contas pagas, seu sonho voltou a ganhar força.

Festival de Gastronomia e Reestruturação

Em 2012, descobriu que grupos estavam se reunindo para fazer o Festival de Gastronomia e foi convidada a participar. Se inscreveu, fez um título de capitalização, mas não tinha espaço. Arrumou sua laje, terminou na própria semana e deu um jeito de participar.
Jura não só fez acontecer, como levou o melhor atendimento e todo sabor do seu coração e sua vontade no prato.

No dia da premiação, que foi na Vila Olímpica, ela diz que jamais imaginava que iria ganhar, e quando viu estava levando para casa 5 premiações: prato mais saboroso, criativo, melhor decorado, 2 lugar cerveja mais gelada e 2 lugar melhor atendimento; “eles gostam mesmo é do tempero da Juju.”

O restaurante antes era chamado “Laje da Jura”, mas com o crescimento e o espaço sem conseguir comportar a quantidade de clientes, fora a dificuldade de acesso, surgiu a oportunidade de alugar um bar no mirante do teleférico, na Praça Américo Brum. Quando abriu o teleférico e estava em funcionamento, os bailes funks aconteciam e turistas circulavam mais. Depois que o teleférico parou, veio a crise financeira, pandemia, e trouxe golpe em cima de golpe.

Segredos do sabor

Ainda sim, Juraci se mantém firme operando o bar. Lá, conta com uma ajudante e a prima, Luciana. Durante a semana são servidas as “comidas do dia a dia”, como a carne assada, na quarta-feira, que é simples mas tem seus segredos. “Tem que saber fazer! você assa na panela e aos poucos vai regando com água, e esperando. Cozinhar exige tempo e paciência. E não tem nada de dourar no açúcar ou cebola, ela é dourada na panela, amolecendo e pegando a cor bonita dela natural.”
Na sexta tem pernil, que é assado da mesma forma, para servir com baião de dois, mocotó, dobradinha.

Todos os pratos são da culinária brasileira, mas ela diz que pode fazer qualquer outro.
O nhoque com camarão, por exemplo, que é o prato mais famoso do lugar, é a mistura do Nordeste com a Itália. “Prefiro fazer sem muita mistura de tempero, porque se botar muita você nao sabe nem o que está comendo. Geralmente uso alho, sal, vinagre, pimenta do reino e cominho.” Essa receita venceu o prêmio sabores do porto: primeiro festival de gastronomia da região, em 2012.

E continua: “Aprendi muito sobre as comidas nordestinas com a minha mãe. Eu bem pequena já ficava próxima dela e aprendia tudo olhando, assim como costurar. Depois, trabalhando em casa de família, fui me aperfeiçoando, fazendo sempre do jeito que a pessoa gostava, cada casa do jeito da pessoa.”

Para os leitores que estão curiosos, o segredo, segundo ela, é fazer com carinho, amor e produtos de qualidade. “Eu faço porque amo o que faço – isso é o mais importante.”

Deu água na boca?

Jura diz que não tem dinheiro, mas tem garra, e que não vai parar. Com fé em Deus ela segue trabalhando e, devagar, respeitando os protocolos, o espaço vai voltando a funcionar em um ritmo melhor.

E ela não se restringe ao bar, mas atua também com eventos, como dentro da justiça federal, e no MAR, quando tem evento, oferece buffet, com um grupo que se chama “Tabuleiro da Pequena África” organizado pela filha, onde fazem tapioca, acarajé, nhoque, caldos, doces e bebidas; toda a família trabalha junto.

Juraci, que está no livro “mulheres da providência” escrito pelo fotógrafo JR, já serviu figuras como o consagrado chef Massimo Bottura, que comeu “moqueca de peixe e isca de frango empanado, fora o arroz, feijão e ele amou! jogou no instagram dizendo que é a melhor comida do rio”.

O Bar funciona todos os dias, desde a hora do almoço até a noite, no endereço Ladeira do Barroso, 182C – Gamboa. Para comer o famoso nhoque é necessário um pedido com antecedência e um grupo de no mínimo 10 pessoas. O fluxo hoje em dia tem dependido mais dos guias locais que levam visitantes e seguidores da página @bardajura

Jura convida a todos para visitar, trocar um bom papo, tomar uma cerveja gelada com uma vista excelente para a cidade do samba, cais do porto, Niterói. O espaço é aberto e o clima muito bom. E, lembrando que machucou seu braço recentemente mas continua na função, ela termina: “mesmo com a asa ruim eu não paro!”.

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