Crônica: Necrópole Carioca

Crônica: Necrópole Carioca. (Ilustração: J. Victor).

Emanuel, varejista ambulante de substâncias ilícitas, com aproximadamente 20 anos de idade.

Conheceu drogas psicoativas na Lapa − química fina que age principalmente no sistema nervoso central, onde altera temporariamente a função cerebral, muda a percepção, o humor, o comportamento e a consciência – a qual, ou através da qual, usava para ter a sensação de escapar à miséria.

Emanuel, primeiro, tirou uma grana com roubos, durante um tempo. Depois de quinze anotações criminais, decidiu vender a mesma sensação substituta da realidade que conhecera. O cliente tem sempre razão, ouvia. Era tanto que a playboysada clamava que, fez até de seu entorno uma modinha. Abastecia tudo quanto ela queria.

Tão logo umas Marias bonitas foram pegas com os olhos, os narizes nos lustres, tremendo com uma quantidade boa na bolsa, caguetaram. Apontaram logo um otário.

Os P2 não queriam estardalhaço. Nas suas mentalidades podiam dar-lhe uma surra, tiro, facada, tortura, sequestro. Fizeram nada disso, seguiram a etiqueta, o acharcaram.

Tudo amarrado. Viveram uns anos assim.

Toda vez que os P2 passavam, Emanuel perdia. Vezes levava umas tapas. A taxa, apenas, aumentava.

Mas, não estava sozinho. Os P2 faziam isso em todas as favelas da Zona Sul, do Centro do Rio ao Complexo do Alemão. Complexo da Maré, todo o subúrbio. Baixada e Zona Oeste ora, com nome de milícia. Quando não pagavam o arrego, os P2 se transformavam em policiais fardados, com os dedos nervosos da isonomia do Estado. O governador, o comandante da força a esquadrões especiais, cinicamente, deflagravam operações vingança, sucessivas vezes, para segurança das famílias. Chegavam pesado. Dessas intervenções os resultados eram sempre, chacinas. Com quantidades de corpos subestimados, muitos entregues, outros quantos sumidos. E, que na época em que vivemos, tristemente, são usadas como peças, a torto e à direita, à propaganda política.

Por fim, na Rua Joaquim Silva onde Emanuel, privado de qualquer forma de obstrução, completamente desarmado, após, imobilizado, foi morto com um tiro à queima-roupa na cabeça. Moradores foram encontrá-lo estirado, tendo ainda contrações no asfalto. Instalou-se uma confusão. Os protestos se notabilizaram até as mediações da Mem de Sá, sitiando o trânsito, tacando foco ao mesmo. Holocausto negro, gritavam. Enquanto, os PMs alegavam reação ao mandado de prisão e Emanuel virava número num arquivo estatístico qualquer, a Justiça, mesmo sem provas, não veio os questionar em relação as testemunhas, por simplesmente possuírem os polícias, direto da necrópole carioca essa coisa confiável, intransponível, chamada, ”Fé Pública”.

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