Crônica: desastre anunciado

Dois casos, que chegaram durante a semana, intrigaram uns poucos leitores à roda de uma praçinha nos confins da Leopoldina, onde não se pisa sem conhecer o terreno.

Uns comerciantes comentaram, uma caixa de padaria a um cliente também, uma funcionária da lotérica, dois carregadores da vidraçaria, e o próprio dono da banca de jornal, que lia de tudo, do contêiner rumo à extinção.

Angélica, diarista, solteira, com 26 anos de idade, teve 85 por cento do corpo absorvido pelas chamas.

O hospital a recebeu com gritos de dor indescritíveis, ponderou à recepcionista. E, Geisa de 32 anos, mãe solo de um menino de oito meses, desempregada há tempos, chegou à emergência desacordada, com queimaduras de terceiro grau que cobriam a estatura por completo.

Muitos dos que leram apenas as chamadas passaram os seus dias supondo, por que seus namorados fariam desmedida barbaridade, motivo passional quem sabe? Do restante, que se dignou a ler o acontecido, por lerem como quem lê, na brevidade da vida, não foram longe, enxergando simples acidente, não desvendaram.

Não. Nem Angélica nem Geisa foram vítimas de um tipo de possessão medonha, comum por essas bandas, ou de mera eventualidade.

Tão logo tiveram uma brecha, perto do almoço, prepararam o que tinham a mão. Porque pobre se vira com o que tem e pede bênção. Não recorrendo aos vizinhos, naturalmente. Mas, como a prática não garante o êxito da operação…

As duas jovens mulheres depois de agonizantes 15 dias cada, inteiramente enfaixadas, sem se mexer, nem comunicar, sucumbiram, por terem de se arriscar a cozinhar, como hoje 14 milhões de famílias cozinham no país: a carvão, a álcool, ou à lenha. O que os leitores não indagaram, e que os jornais não informaram foi o verdadeiro assassino.

A alta dos preços do gás a domicílio.  

O gás natural é o primeiro componente na destilação do outro negro, o petróleo. A paridade a cotação do dólar e a sub-produção e venda de refinarias nacionais levaram nossa gente há um outro século. Gente tão boa, passiva às escuras. Essas moças foram condenadas. E quantas outras não viraram censo? Pois aqui, ninguém será posto a júri, ou tornará réu, nem condenado.

Essa política anunciada, pelo governo, como salvadora da empresa estatal responsável pela extração, refino, distribuição e comercialização dos recursos das profundezas de nossa terra, até então, batem recordes de lucros aos acionistas estrangeiros. É esse fanatismo neoliberal que tantos cardeais da economia pregam. Com destaques em jornais. Tampouco dizem ou o leitor questiona, que isto, afinal, é em detrimento de nossa gente.

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