Crônica – Crise e funeral

Ser humanoide da natureza que está presente nas artes e pinturas de rua de Danieli Duarte Foto: arquivo pessoal

Depois de vagar 8 longos meses pelas ruas vazias do RJ trabalhando como serviço essencial na pandemia do Covid-19, uma notícia: meu patrão Wilson mandou um vídeo para os funcionários anunciando corte de pessoal. Os funcionários vão ao cume do estresse em fração de segundos. Só me lembro da primeira e última frase dele: “Bom dia e Boa sorte.”
Definitivamente não era de sorte que precisávamos. Wilson nunca verá aquelas expressões de desespero dos meus colegas, nem a minha!
Aquele vídeo estava vindo da Suíça, país onde ele administra uma perfumaria, aqui no Brasil ele tem um supermercado, local em que eu trabalho. Wilson é biólogo marinho. Pois é, ele não tá na área de atuação dele.
No mesmo dia, outra notícia: A Pfizer junto com a Biontech desenvolveram uma vacina, mais barata que a Sputnik, a única vacina existente até então.
Respiro aliviada com mais um imunizante, já que em questões pandêmicas é dever diplomático de todos os países comercializar as matérias primas com os governos mundiais. Como a alegria de pobre dura pouco, o presidente da República aumenta veementemente sua campanha de pré-tratamento com cloroquina, mesmo os cientistas descartando a possibilidade de ação positiva do fármaco em relação ao vírus da Covid-19. Segundo ele era só uma gripezinha.
Meu amigo usa cloroquina para tratar Lúpus e me contou que estava caríssimo e complicado para achar nas farmácias. Os efeitos colaterais variam de dor de cabeça e febre à confusão mental e convulsões.
É um medicamento específico demais para usarmos sem necessidade.
Achou pouco?
A ciência previu e acertou: a mutação do Covid-19 chegou ainda mais letal.
Agora, mais de um ano depois do começo da pandemia, na faixa de 40000 mortos, o representante da Pfizer revela na CPI que pelo menos 2 propostas de negociação foram negadas pelo governo federal, trazendo à tona o descaso e incompetência da atual gestão presidencial.
Aliás, Negligência seria mais correto falar, já que em termos de propagação do vírus e omissão o governo Bolsonaro se demonstra competente até demais, pois é onde eles estão se empenhando.
Pelo menos 10 amigos meus foram demitidos antes de mim e a realidade é universal. Sem vacina, sem emprego, e com a saúde em cheque.
É um momento de nos unirmos e cuidarmos uns dos outros, pois o poder público tem se demonstrado insuficiente por estratégia e não podemos sucumbir aos planos maléficos de sucateamento de serviços. A constituição e o conhecimento são os únicos bens que nós, brasileiros de periferia, temos a ofertar de herança para os nossos filhos.
Enquanto isso, a marcha fúnebre prossegue.