Cidadania invisível e a dignidade além dos muros

Marinaldo Soares Barbosa, 63, morador do Bairro 13 de Maio, em João Pessoa-PB. Um homem sonhador, sonha com um mundo melhor, com pessoas melhores.

Ele sonha com o amor genuíno, e acredita que todas as pessoas merecem uma segunda chance na vida. Um cidadão que busca sempre democratizar oportunidades para todas as pessoas, independente da situação que ela esteja.

“Posso estar numa pior, mas se precisar de mim, darei o meu melhor sempre, isso desde minha juventude”, comenta Marinaldo.

Sua dedicação para alcançar os objetivos é diária. Já se machucou muitas vezes, caiu algumas, mas se reergueu e continua nessa jornada de ajudar ao próximo.

Crédito: Arquivo pessoal

Marinaldo é Bacharel em Ciências Contábeis pela UFPB, Psicopedagogo pela UFPB, pós graduado em Contabilidade Comercial pela UFPB- Universidade Federal da PAraíba, MBA em Finanças Publicas, formado em Teologia pelo Seminário Arquidiocesano da Paraíba.

Assim, te convido para conhecer o trabalho social realizado por ele através da Pastoral Carcerária nos presídios de João Pessoa- PB.

Ele cedeu uma entrevista e conta parte dessa ação social, da qual ele entende como uma missão. Confira e se inspire nessa história.

Pastoral Carcerária

Sua motivação para fazer a Pastoral Carcerária nos presídios começou em 2013, quando estava com uma turma de catequese de crisma jovem na igreja Católica no Porto de João Tota, no Bairro de Mandacaru, periferia de Joao Pessoa, na capela de Nossa Senhora Aparecida.

“Estávamos na mistagogia (preparação de sacramentos da igreja católica), e um de nossos crismados foi preso, fiquei muito angustiado com a situação, pois tinha certeza que ele não tinha feito nenhum ato criminoso, eu fiz de tudo para ir até ele”, comenta Marinaldo.

Então ele procurou seus superiores, da coordenação pastoral, e depois de 3 meses teve a resposta com autorização para ter contato com o jovem, mas apenas por intermédio de Neci Soares que já dava catequese lá no presídio há muito tempo.

“O dia tão esperado chegou e foi inesquecível, encontramos Carlos Henrique Nogueira Barbosa, e foi àquela alegria, e através dele conheci outros apenados, pois catequizo há mais de 18 anos na área de Mandacaru, e quando cheguei encontrei muitas pessoas que jamais saberia que estavam presas. Através dessas pessoas fiz a ponte e foi mais fácil meu acesso para continuar com a missão”, declara Marinaldo.

Quais as atividades são realizadas dentro das unidades prisionais?

São realizadas atividades culturais de teatro, música, artesanato, alfabetização/reforço escolar.

Também são feitas visitas nas suas celas para um momento de oração.

Temos catequese de crisma com batismo e 1ª eucaristia, isso acontece com a Pastoral da Escuta.

Colocamos uma cadeira no meio do pátio com um cartaz: se estiver com vontade de falar com um amigo, estou te esperando! Muitos vem, outros não, muitos contam sua trajetória, pedem material de higiene, outros sentam, ficam calados e vão embora.

Outros falam demais, é uma experiência muito confortante. Sempre que possível rezamos o terço e lemos a liturgia do dia com eles.

Quais as dificuldades de atuar nas unidades prisionais?

A falta de cuidado dos egressos, eles saem das prisões sem trabalho, vão para semi aberto e tem que voltar na hora determinada, mas muitas vezes não tem dinheiro para o transporte e assim quebram a pena e retornam aos presídios.

Não existe sensibilidade por parte dos governantes nem do secretariado na área penal, é desumano ver celas cheias de pessoas, tratadas como animais.

Falta um nutricionista para que os presos comam com dignidade, eles fazem a comida de qualquer jeito, é muito precária a assistência do estado na ressocialização dos egressos. Falta psicólogos, psiquiatras, sociólogos para ouvirem as lamurias dos apenados

Com a superlotação, é muito preocupante, o número reduzido de agentes, o numero de voluntários da igreja católica para ajudar na catequese é muito baixo por falta de estimulo das paroquias, a falta de sensibilidade dos diretores na educação da fé. Falta advogados para ajudar os apenados de outros estados a rever suas penas, falta material de higiene, necessária a pessoa humana.

Quais os ensinamentos em atuar com os apenados?

Estar junto das pessoas privadas de liberdade. Só a proximidade que nos faz amigos nos permite apreciar profundamente os valores das pessoas privadas de liberdade, seus legítimos desejos e seu modo próprio de viver a fé.

Lutar para cancelar toda legislação e normas contrárias à dignidade e aos direitos fundamentais às pessoas privadas de liberdade.

Respeitar a dignidade da pessoa humana. Isso significa tratar o ser humano como fim e não como meio, não o manipular como se fosse um objeto; respeitá-lo em tudo que lhe é próprio: corpo, espírito e liberdade; levar a palavra de Deus e ver ao longo do tempo aquele diamante bruto se transformar numa bela pedra preciosa.

A pastoral da escuta é de muita valia.

De que maneira as práticas com os internos surtem efeitos positivos na vida de cada um, família e sociedade?

As praticas surtem efeitos com a atenção diferenciada. Sabemos que a maioria não gosta de religião mas a minoria que gosta agente ver um progresso no comportamento e surte efeito na família e na vida dos egressos quando saem.

O estar juntos para ouvir e fazer a ponte entre eles e a justiça, entre eles e os promotores de justiça, entre eles e os juízes e juíza, o estar juntos para apresentar-lhe a beleza do Deus que habita dentro dos corações deles, fazem a diferença

Existem parcerias com empresa ou instituições sociais para acolher as pessoas quando estão em liberdade?

Não temos parceria, temos um setor do governo de ressocialização, mas esta iniciando agora, muito precário.

A Pastoral Carcerária atua de forma independente, sem ajuda de órgãos públicos ou iniciativas privadas, temos apoio da sociedade civil e alguns coletivos sociais, amigos e familiares.

Alguns ativistas contribuem de forma mais ativa, exemplo de: Ozinete Barros de Freitas, Solange Mousinho Alves e Henrique Wagner Avelino.

O ideal é que em cada presídio, quando o apenado for para o semi aberto ele ter uma casa de apoio para ajudar, pois a maioria deles saem sem trabalho e sem condições de se reintegrar por falta de apoio da família, sociedade e dos governos.

Quantas pessoas conseguiram transformar sua vida após participarem das atividades com a Pastoral Carcerária? Pode relatar um caso específico para exemplificar? 

Nos sempre temos motivado as pessoas que saem da prisão a encontrar uma profissão para sobrevivência da sua família. Temos recentemente um lava jato de Thiago Galdino de Andrade, que estamos montando la no Renascer III, e la no mutirão de Bayeux a pastoral carcerária montou uma Barbearia para Davi de Vasconcelo Silva, para ele sobreviver da profissão que tem.

E assim que conseguimos ver a habilidade das pessoas em seus respectivos lugares nos vamos montando um ponto comercial pedindo a comunidade para ajuda-los.

Recentemente temos o Eduardo Jorge Dias de Melo, também que trabalha em uma vidraçaria e motivamos eles a pegar o resto, as sobras dos vidros e fazer jarros para comercializar com as floriculturas, e assim vamos caminhando, sempre juntos

A pandemia dificultou a realização das ações dentro dos presídios?

Por conta da pandemia nós não estamos evangelizando devido a maioria dos membros terem mais de 60 anos e fazerem parte do grupo de risco. Temos um grupo onde acompanhamos as famílias e os egressos.

O coordenador da Pastoral carceraria conseguiu neste tempo de pandemia um vale de R$ 300 reais para ajudar na alimentação, num projeto Recomeçar que estava se instalando em nossa cidade de João Pessoa.

Conseguimos também feiras para esses egressos para ajudar na alimentação do mês, mas não temos nada pontual.

O Pe Valdezio Nascimento fez uma campanha para adquirir material de higiene para todos os presídios da grande João pessoa, cada mês se arrecada e leva-se para ser distribuído.

Antes desta experiência com os apenados quais outras ações sociais realizou?

Participei da pastoral da Terra e da Pastoral de Rua com o Pe Vicente Zambelo, fui voluntario do Hospital do Câncer, em João Pessoa-PB, Napoleão Lauriano, fazia campanha para conseguir lençóis para os internos por 7 anos, confortando as pessoas doentes coma palavra lida e rezada.

Passei também 7 anos no leprosário da Paraíba com um grupo espírita coordenado por Neci. Foi uma experiência muito rica também.

Fui catequista nas comunidades Nossa Senhora das Graças, Capela São Pedro e Porto de João Tota, na Capela de Nossa Senhora Aparecida.

Atuei como ministro da palavra e da eucaristia em todas as capelas da Paróquia do Sagrado Coração de Jesus. Fundei o terço dos homens e da adoração, a Eucaristia no Santuário de Nossa Senhora das Graças no condomínio dos Ipês I.

Mensagem de paz e fé

Pelo amor, o homem se torna um outro Cristo, já dizia Santa Catarina de Sena. E para reforçar deixou um ensinamento de Santo Inácio de Loyola: Não é o muito saber que sacia e satisfaz a alma, mas o sentir e saborear internamente as coisas”.

Essas frase seguem minha vida pessoal e profissional. Sempre procuro me colocar no lugar do outro, para sentir sua dor, sua necessidade. Ver sempre no próximo, Jesus. Amar e servir resume toda a minha vida, pois segue o mandamento que Jesus cristo deixou, amar a Deus e ao próximo com a si mesmo.

Marinaldo é Diácono pela Arquidiocese da Paraíba, Curso de Filosofia e Professor de contabilidade Comercial, Bancário aposentado após 38 anos exercendo a profissão. Ele iniciou no Banco do Estado da Paraíba em 1978, passando pelo Banco Real e o Banco Santander.

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