Brasil retrocede em direitos humanos, mostra relatório da Anistia Internacional

Ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, o presidente da República, Jair Bolsonaro e o Ministro de Estado da Defesa, Fernando Azevedo
Anistia Internacional critica autoridades brasileiras (Foto: Marcos Corrêa/PR)

Em 2019, o presidente Jair Bolsonaro e outras autoridades brasileiras adotaram discurso abertamente contrário aos direitos humanos e impuseram medidas administrativas e legislativas, com impactos concretos na limitação e na perda de direitos fundamentais da população, aponta o relatório “Direitos Humanos nas Américas: retrospectiva 2019”, da Anistia Internacional, divulgado nesta quinta-feira, dia 27 de fevereiro. O levantamento mapeou o cenário de 24 países das Américas, entre eles o Brasil.

O relatório também destaca o aumento no número de homicídios cometidos por policiais em serviço no Brasil; homicídios e ameaças contra defensores dos direitos humanos; graves crises ambientais na Amazônia que afetaram de maneira desproporcional os povos indígenas, os quilombolas e outras comunidades tradicionais locais e tentativas de restringir as atividades das organizações da sociedade civil. Para a Anistia Internacional, as autoridades brasileiras não ofereceram uma resposta adequada a uma série de violações dos direitos humanos.

“2019 foi um ano de retrocessos. Os ataques aos direitos humanos no Brasil foram tão brutais, que parecíamos estar vivendo antes da Constituição Federal de 1988, que nos garante direitos fundamentais. A retórica de linha dura que autoridades federais e estaduais adotam abriu espaço para violências cometias, também por agentes do Estado, especialmente contra defensores e defensoras dos direitos humanos, negros e negras, moradores de favelas, indígenas, pessoas LGBT e mulheres”, afirma Jurema Werneck, secretária executiva da Anistia Internacional Brasil.

Dispositivos legais, bloqueio de investigação e armas de fogo

O relatório afirma que autoridades federais brasileiras promoveram decretos, medidas provisórias e projetos de lei que ameaçam os direitos humanos no país. E cita, como exemplo, o pacote anticrime, proposto pelo ministro da Justiça Sérgio Moro, por conter uma “definição muito geral e imprecisa” do excludente de ilicitude no caso da legítima defesa, que “poderia ser usada para justificar o uso excessivo de força letal por agentes do Estado” e que “está muito longe de cumprir os direitos e normas internacionais dos direitos humanos”. Critica também as ações tomadas pelo governo federal para flexibilizar o acesso a armas de fogo e o bloqueio da investigação dos crimes de direito internacional cometidos durante o regime militar.

Direitos dos povos indígenas

 Sobre os direitos dos povos indígenas, a Anistia alerta que o governo de Bolsonaro em vez de protegê-los, adotou várias medidas que os colocaram ainda mais em risco, como a retirada da Fundação do Índio (Funai) de suas competências para demarcar terras indígenas e outorgar licenças ambientais. E esses riscos ficaram evidentes no aumento de invasões em terras indígenas, que passaram de 96 em 2017 para 109 em 2018, e aumentaram de forma dramática em 2019, com 160 casos registrados somente nos primeiros nove meses do ano, segundo o Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Relatório da organização Global Witness assinalou um número crescente de homicídios de ativistas ambientais, inclusive lideranças indígenas, associados à extração de recursos naturais.

Crise ambiental na Amazônia

A organização não governamental destacou também as queimadas ocorridas na Amazônia, que chamaram a atenção do mundo para as políticas do governo em relação à preservação da floresta. De acordo com a Anistia, algumas evidências apontaram para uma associação das queimadas com interesses do agronegócio.

A ONG afirma que até o fim do ano, o governo federal não havia apresentado nenhuma política pública consistente para prevenir as queimadas e os desmatamentos, nem para proteger e assistir às populações afetadas. E não houve interesse em abrir investigações independentes para descobrir como começaram e responsabilizar os envolvidos nos incêndios.