Base Nacional Comum Curricular: práticas, reflexões, desafios e possibilidades.

 

As discussões sobre as concepções e metodologias de ensino vêm se aflorando especialmente nos últimos dias, principalmente pelo pouco investimento que é feito na educação pública, reclamado pela população; seja na Educação Básica ou no Ensino Superior. Como em cada tentativa de interferência por membros do setor público federal nas práticas pedagógicas, percebe-se que, em muitos casos, geralmente, quem faz intervenção na educação não está em sala de aula ou, se quer, tem experiência em docência.

As discussões recentes estão em torno da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que é: “o documento que define é um documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essências que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica. (MEC 2019)”. Prevista em lei, ela deve ser obrigatoriamente observada na elaboração e implementação de currículos das redes públicas e privadas, urbanas e rurais. A questão é saber como a BNCC pode influenciar no dia a dia da educação no setor público e privado. O desafio está posto à sociedade e precisamos incentivar a mobilização social para uma leitura crítica no sentido de compreender as responsabilidades dentro e fora das escolas.

É importante ter referência de quem está familiarizado com a formação inicial de educadores, bem como formação continuada daqueles que já estão na prática docente. As informações sobre esse assunto vem da contribuição de uma Mestre em Educação, Especialista em Direito Educacional, professora Terezinha Amaral, da Universidade Estadual do Maranhão, do Centro de São Luís. Professora há mais de trinta anos na rede pública, coordenadora pedagógica, com experiência em consultorias educacionais. Desenvolve projetos de extensão voltados para o apoio pedagógico de professores alfabetizadores e Primeira Infância e contribui também com instituições filantrópicas com foco em educação.

Então, vamos aprender um pouco mais sobre as questões da BNCC com a Professora Terezinha, que apresenta argumentos sobre algumas perguntas.  A aula começou, atenção turma.

1- Qual a importância da BNCC?

Bem, como já foi dito, a BNCC, hoje já homologada para toda a Educação Básica é um documento normativo que deve orientar o planejamento das Secretarias de Educação, das instituições educativas, principalmente das escolas. Mas é importante compreender que a BNCC não é currículo, muito menos um conjunto de conteúdos, mas ela define, em linhas gerais, os direitos de aprendizagem, as aprendizagens essenciais e as competências que devem ser desenvolvidas para que sejam garantidos os direitos de aprender e construir cidadania a todos, conforme já sabemos desde a nossa Constituição Federal, nos artigos 205 e 210.

2  Quais setores da sociedade estão discutindo a implantação da BNCC?

A discussão sobre a BNCC agora é sobre seus processos de implementação no âmbito dos estados e municípios, das secretarias de educação e das escolas. Porque já foi elaborada, passou por algumas versões cujos momentos teve considerável participação da sociedade, ainda que não suficiente o bastante. Agora como já é uma política pública, é necessário que os movimentos sociais se mobilizem, as diversas instituições para conhecer, ler, discutir e contribuir com a escola, em sua comunidade, cobrando, oferecendo sua parceria, disponibilizando-se para construir ambientes de aprendizagem mais atraentes e significativos.

3- Quais mudanças a BNCC propõe?

Como em documentos anteriores, tal como os Referenciais Curriculares para a Educação Infantil, as Diretrizes Curriculares Nacionais e outras importantes diretrizes, resoluções e decretos, que são normativos, a BNCC propõe fundamentos e orientações metodológicas focadas na necessidade de garantir direitos pela via da educação e do ensino. Oportuniza um novo olhar para pensarmos a questão das competências, construídas a partir de habilidades. Porém, se os professores, coordenadores não se apropriarem desta leitura, não poderão vê-la como referência para discussões, críticas e reinvenções. Por outro lado, há muita lacuna, por exemplo, em relação à Educação de Jovens e Adultos e outras modalidades, é preciso ampliar a discussão para que esses direitos se tornem mais claros, no discurso e na prática, Daí a importância de não entender a BNCC como uma camisa de força, um receituário apenas para ser colocado em prática. Há que se avaliar o texto deste documento, as entrelinhas e os objetivos postos, pois não podemos aceitar que seja simplesmente um documento legal. Há intenções aí, por isso digo que não é um referencial neutro. Que críticas podemos fazer? Há concepções elitistas, conservadoras; há uma expressão da diversidade, uma legitimação de como devem ser as relações ao mesmo tempo que não deixa de ser mais uma base legal para garantia dos direitos de aprender e ensinar. A experiência nos mostra que não muita coisa, quando não é garantido o direito do professor de ter uma formação continuada mais sistematizada, mais consistente, voltada para fundamentar e enriquecer a sua prática.

4- Porque alguns movimentos sociais estão contrário a implantação da BNCC?

A questão da participação social sempre foi um gargalo em nosso pais. Se formos retroceder um pouco, desde 2014, as discussões estavam sendo feitas, contudo, com grupos mais restritos. No entanto, muitas escolas, professores e secretarias foram orientados a participarem nas plataformas disponibilizadas pelo MEC. Reconhece-se que a participação social foi mínima, especialmente na terceira versão, quando da transição do Governo Dilma ao Governo Temer. Foram momentos de muita tensão, conflitos ideológicos e disputas político partidárias. Mas para garantir um processo democrático, acredito que a sociedade deve continuar se posicionando, apropriando-se documento para conhecimento prévio e ir à luta pela garantia dos seus direitos, porque se formos observar, há muitas metas no Plano Nacional de Educação, de 2014, que muitos municípios e estados e a União ainda não conseguiram alcançar. Muitas representações sociais participaram, mas infelizmente a maioria ficou de fora dessa discussão para a sua elaboração. Agora é tentar acirradamente se organizar para não ficar de fora dos processos de estudos e organização das escolas, professores e alunos para a implementação da BNCC.

5- Em sala de aula com os estudantes de pedagogia como é discutido esse assunto?

A Universidade Estadual do Maranhão e creio que as outras universidades tem se mobilizado para discutir, emitir pareceres, criticas, contribuir através de uma revisão de seus programas, realização de seminários, encontros acadêmicos, aulas feitas com rodas de conversas, inserindo essa temática nos grupos de estudos e pesquisas, nas jornadas, semanas de Pedagogia, eventos acadêmicos com outros cursos de licenciatura, cursos, oficinas, mas sempre observando a questão da importância de uma leitura crítica do documento. O curso de Pedagogia tem se posicionado no sentido de que, em todas as disciplinas especificas do designer curricular atual se traga uma discussão mais aprofundada, leituras instigantes, debates mais participativos. Creio que nossos futuros educadores estejam atentos e mais preocupados em, primeiro, conhecer o documento, segundo discutir e experimentar, nos estágios, nas práticas acadêmicas e até mesmo, como muitos já trabalham, de levar essas inquietações para dentro de suas escolas.

6- Para os professores que já atuam em sala de aula percebe-se um número maior de simpatia com o tema ou rejeição?

Com as experiências que temos tido em relação ao acompanhamento de professores efetivos nas escolas, tanto públicas como privadas, é que muitos ainda não conhecem a BNCC, estão apreensivos, e muitos estão se sentindo até pressionados para ter que adaptar seus planos e atividades às competências da BNCC, mesmo sem terem participado de alguma discussão ou formação sobre o tema. Creio que o número de rejeição seja bem significativo, não apenas por parte dos professores. Há também muitos gestores e coordenadores totalmente alheios às novas políticas educacionais e que não tem fomentado, em suas escolas, uma discussão mais focada. Muitas secretarias de educação estão ainda sem se apropriar das diretrizes do MEC, dos guias de implementação e ainda não tomaram pé da importância dos documentos curriculares para os territórios, documentos esses que foram elaborados pelas equipes dos estados e municípios para traduzir com mais detalhes as orientações da BNCC para as localidades, respeitando-se as diversidades sociais e culturais. Penso que a rejeição, muitas vezes, é por conta da falta de informação e envolvimento que deveria ser incentivada pelas equipes gestoras nessas instancias. Porque, um professor envolvido, já não vai ter uma postura de “rejeitar” mas sim de discordar, fazer críticas, e de reivindicar o que é de direito para si e para seus alunos.

9- Qual a importância da família e da sociedade entenderem sobre a Base Nacional Comum Curricular?

Eu diria que TODA importância, as famílias tem todo o direito de conhecer, compreender, participar e reivindicar os seus direitos e de seus filhos. Assim como tem de conhecer o Marco Legal da Infância, o Estatuto da Criança e do Adolescente, dentre outras legislações. Daí a importância da participação das instituições sociais educativas não formais, associações, agremiações, conselhos tutelares, agencias sociais. No entanto, eu quero chamar a atenção é que a escola, sobretudo não deve prescindir desse direito. A discussão deve estar na escola. Os alunos tem o direito de ter suas aulas e os professores a sua formação em serviço para ler, debater, discutir, aprimorar-se e isso precisa ser garantido. Precisamos aí então de gestores atentos, professores mobilizados de forma que a própria escola possa ser agencia articuladora nesse processo tão desafiador que é a implementação crítica e contextualizada da BNCC, respeitando-se a diversidade cultural, o ser humano e seus coletivos.

O assunto é um tanto denso, mas de suma importância para que seja analisada as possíveis mudanças e que possa melhorar a aplicação dos conteúdos esperados por todos setores envolvidos, possibilitando assim um aprendizado eficiente e qualitativo.

“Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser o opressor”.  Paulo Freire

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Paulo de Almeida Filho
Jornalista, Especialista em Comunicação Comunitária, Mestre em Gestão da Educação, Tecnologias e Redes Sociais - UNEB - Universidade do Estado da Bahia. Editor da Agência de Notícias das Favelas. Pesquisador do CRDH- Centro de Referência e Desenvolvimento em Humanidades - UNEB - Universidade do Estado da Bahia. Professor de Pós Graduação, em Comunicação e Diversidade, na Escola Baiana de Comunicação. Assessor da REDE MIDICOM- Rede das Mídias Comunitárias de Salvador. Membro do Grupo de Pesquisa TIPEMSE - Tecnologias, Inovação Pedagógicas e Mobilização Social pela Educação. Articulado Comunitário do Coletivo de Comunicação Bairro da Paz News. Membro da Frente Baiana pela Democratização da Comunicação. Integrante do Fórum de Saúde das Periferias da Bahia. Membro da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito- Núcleo Bahia. Integrante da Rede de Proteção de Jornalistas e Comunicadores Coordenador Social do Conselho de Moradores do Bairro da Paz, EduComunicador e Consultor em Mídias Periféricas.