Em uma das cenas do documentário “A batalha do passinho” (que tem sua estreia no domingo, em sessão para convidados, às 19h30m, no Centro Cultural Justiça Federal 1 — veja o trailer), o dançarino Gualter Damasceno Rocha, mais conhecido como Gambá, aponta para sua própria imagem no YouTube e, para lá de blasé, alerta os desavisados do outro lado da câmera: “Tem que ser bom pra botar um vídeo aqui, fio!”

— Gambá tinha um quê de Charles Chaplin. Ele era um pouco mímico, interagia com a plateia. E muito do que ele fazia não era planejado — conta o diretor do longa, Emílio Domingos, que, em pouco mais de um ano, se viu jogado num turbilhão de emoções, muitas deliciosas e algumas terríveis (como a provocada pelo assassinato de Gambá, em janeiro).

Realizador de “L.A.P.A.” (2008), documentário sobre as batalhas de rima dos rappers na Lapa, Emílio vinha acompanhando há três anos o fenômeno do passinho do menor: dançarinos de funk muito jovens, de favelas e bairros pobres do Rio, que se desafiavam no YouTube com vídeos de coreografias mirabolantes.

— Eles expressavam na dança toda a antropofagia do funk, incorporando todas as influências ao redor. E a internet era a arma que tinham — explica Emílio, que, aí, no ano passado, inesperadamente, foi convidado para ser jurado de um concurso de passinho, promovido pelo escritor Julio Ludemir e pelo músico Rafael Nike. — Aceitei, mas logo no dia seguinte abandonei a função. Vi que tinha que filmar aqueles garotos, ouvir suas histórias.

Foi aí que passaram pela sua vida figuras como Cebolinha (o veterano da turma, com 23 anos), Baianinho, Beiçola, Camarão Preto, Charlinho, João Pedro (de 14 anos, que não frequentava bailes funk e conheceu o passinho pela internet) e a revelação, Cristian, de apenas 9. Todos dançarinos tão talentosos quanto vaidosos. Sobrancelhas modeladas, roupas e tênis de grife, óculos transados, tudo isso fazia parte do arsenal que usavam para humilhar os oponentes na pista. Ou para demonstrar justa indignação quando derrotados.

— Ninguém ali tinha problema de autoestima! — brinca o diretor, que inicialmente pensava em fazer um curta-metragem, mas foi surpreendido pela qualidade do material filmado. — No último dia da batalha, vi que tinha um longa.

A fama na ‘TV Xuxa’

Mas a história não acabou ali, no fim do concurso. A repercussão midiática (especialmente graças à “TV Xuxa”, que cobriu as etapas da disputa, realizadas em quadras de comunidades) trouxe 15 minutos de fama para os dançarinos. E a morte de Gambá (espancado ao sair de um baile funk na noite de Ano Novo) pôs o passinho nas primeiras páginas dos jornais. Emílio conta que foi difícil achar um final para esse seu filme, que começou de surpresa e, agora, ninguém sabe onde vai dar.

— Estou ansioso para ver a reação dos dançarinos ao se verem na tela grande, e não só mais naquela telinha do YouTube — conta Emílio, que realizou “A batalha do passinho” sem patrocínios, contando apenas com a ajuda de amigos.

Na terça-feira, às 16h30m, no Centro Cultural Justiça Federal 2, o filme terá uma sessão popular, seguida de debate com o diretor e convidados.

Fonte: O Globo