330 anos de Curitiba: uma mercadoria que ainda não se tornou cidade para pessoas

Construída para ser referência em urbanismo e inovação, Curitiba completa 330 anos hoje. A capital do Paraná, lembrada pelos seus parques e praças, monumentos históricos e investimentos em tecnologia, é profundamente atravessada e dividida pela desigualdade social e econômica, marcadores que transformam completamente a forma de viver na cidade.

Existe a Curitiba que corresponde ao mapa, oficialmente dividida em oito administrações regionais que abrangem seus 75 bairros, como nomes de ruas e homenagens a moradores ilustres como Mateus Leme, Baltazar Carrasco dos Reis, Gabriel de Lara e tantos outros colonizadores.

E resiste a Curitiba fora dos mapas e cartões postais, com mais de 400 ocupações de moradias, quatro mil casas sem banheiro e 84 mil pessoas vivendo em extrema pobreza, ou seja, com menos de 89 reais por mês. Com suas ruas sem CEP, sem saneamento básico, eletricidade, sem direitos de existir.

São as dona Júnia, Carla, Márcia, Juliana, os seu Sebastião, Ivo, Juan, Paulo e tantos outros cidadãos, na maioria negros, indígenas, nordestinos e nortistas, migrantes ou simplesmente filhos sem herança que não são considerados parte da população de Curitiba.

Divisões históricas de Curitiba

A divisão da cidade, entre a Curitiba cidade-modelo e a Curitiba da resistência sempre esteve presente ao longo da história da capital. No último século da cidade, os mecanismos de arquitetura e marketing que consolidaram a capital como marco de tecnologia nas décadas de 30, 40 com arquitetura e praças; entre as décadas 70 e 90 no transporte e sustentabilidade; e nos anos 2000 com tecnologia e internacionalização, também foram cruciais para o silenciamento e apagamento para a luta contra as desigualdades na capital.

As agendas de lutas sociais sempre existiram. Enquanto, no início do século passado, a cidade se esforçava para ser consolidada como capital europeia do Brasil, havia a maior população negras e negros desde o início do século, de acordo com a pesquisa A racialização do espaço urbano da cidade de Curitiba- PR, de Glaucia Pereira, mestre em Geografia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Os espaços de memória, resistência e cultura afrobrasileira foram sistematicamente apagados e violados. As décadas seguintes também são marcadas por contradições, e, enquanto o crescimento de células neonazistas marca a capital paranaense, a cidade também se destaca pelo alto número de etnias indígenas e pela presença da primeira Universidade Federal do país.

De cidade partida a cidade murada

A história de Curitiba é a história de uma cidade partida: de um lado uma elite herdeira e do outro a classe trabalhadora sem acesso à terra. Ao longos dos anos, Curitiba passou de uma cidade partida para uma cidade murada, seja pelos seus muros de concreto que separam aqueles vivem a cidade a partir da ótica da propriedade e da mercadoria, ou pelas barreiras do acesso à cidade: a falta de moradia, saneamento, emprego, violência policial, falta de transporte, disseminação do ódio e fake news.

Desejo para Curitiba a quebra desses muros; que se transforme de uma cidade de mercadorias para uma cidade de gente; que a democracia esteja cada vez mais consolidada; que a cultura da paz e tolerância se sobreponha ao ódio e à discriminação; que trabalho e renda se sobreponham à exploração e opressão e, principalmente, que Curitiba se torne um espaço de gente feliz.

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