Universidade: a disputa para o acesso

Créditos: Reprodução Internet.

A Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ foi fundada em 1920. Desde o início, ela se configura como uma instituição que congrega diversas áreas do saber, sendo a mais antiga do país. Sabemos que as universidades públicas no Brasil se caracterizam como um espaço elitista, frequentadas majoritariamente por pessoas brancas das classes abastadas. O processo de exclusão das classes trabalhadoras nesses locais se dava principalmente pela dificuldade das provas dos vestibulares, em que o conteúdo era complexo e de difícil acesso à maioria da população oriunda da escola pública.

A garantia do ensino brasileiro e diversos direitos sociais passam a ser obrigatórios ao Estado somente a partir da Constituição de 1988, o que o forçou a oferecer educação a todos e todas. No entanto, a qualidade dessas escolas sempre foi motivo de questionamentos – seja pelas condições precárias de infraestrutura, da formação dos professores, dos péssimos salários, a falta de transporte coletivo para o alunado etc. A luta pela educação pública, laica e de qualidade fez com que os governos tivessem que minimamente se preocupar com o que aqueles estudantes oriundos de escolas públicas deveriam aprender.

Com milhares de dificuldades, parte da população mais carente se esforçava ao máximo para que os seus filhos pudessem estudar e ter melhores empregos, muito no sentido da busca por melhores salários, proteção social, dentre outros benefícios. Porém, o vestibular ainda era um grande impedimento para esses alunos de adentrarem as universidades públicas. Após mobilizações e lutas, o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) passou a ser aceito como forma de acesso a essas instituições, o que possibilitou a entrada das classes populares no Ensino Superior, dentre elas, a população negra. Na UFRJ, isso se tornou realidade a partir de 2011. Desde então, começamos a ver um público colorido – aquela e outras universidades passaram a ser mais e mais enegrecidas.

Devemos registrar que isso é uma grande conquista, mas tardia, muito tardia, pois a UFRJ só se tornou acessível aos negros e negras 90 anos após sua fundação. Isso mesmo, 90 anos. E, mesmo assim, a luta continua, pois se já existem as possibilidades de acesso, agora é preciso lutar pela permanência na universidade. Isso requer políticas públicas para transporte, moradia, alimentação, material de estudos. Aos poucos, alguns desses direitos foram conquistados, enquanto outros ainda estão por vir.

Muito bem, existe o acesso à graduação e inicia-se a luta pelo acesso à pós-graduação, que também ainda se configura como um espaço elitista e branco e que precisa ser acessada pelas negras e negros. Começam as discussões, reflexões, debates para a implementação das cotas na pós-graduação, e aí percebemos o quanto mexer com o privilégio daqueles e daquelas que sempre tiveram tudo faz com que muitos que se dizem de esquerda e apoiadores das classes trabalhadoras se mostrem nem tão aliados assim.

As bizarrices aparecem de todas formas e jeitos, desde ao afirmar que implementar as cotas na Escola de Serviço Social da UFRJ para o edital de 2018 é fazer um encaminhamento precoce. O movimento negro debate isso há mais de 20 anos – realmente é o caso de não haver muitos debates ou de que muitos não se interessam pelos mesmos? Outros têm a coragem de dizer que o alunado que entra pelas cotas terá dificuldades ao longo dos cursos e que os professores terão que corrigir da primeira à ultima página das dissertações ou teses. Isso é outro equívoco, pois está comprovado que o rendimento acadêmico dos cotistas é superior ao dos ingressantes pela ampla concorrência.

Enfim, poderia ficar aqui falando de outros episódios vergonhosos, mas tudo isso é para mostrar o quanto esses espaços se mostram fechados à entrada de negras e negros porque isso significa perder seus privilégios na competição por melhores empregos com melhores salários, uma condição histórica dos brancos.

No dia 18 de outubro, foi aprovada a cota de 40% para a população negra, indígena, quilombolas e deficientes na Escola de Serviço Social. Agora, a nossa luta é pela aprovação de 50% das bolsas de fomento à pesquisa para os cotistas. Sim, lutamos e ainda lutaremos muito, mas uma coisa é certa: o privilégio é branco e todas as vezes que negras e negros quiserem mexer ou acabar com eles, saberemos que até mesmo aquelas e aqueles que se dizem empáticos vão mostrar aonde guardam o seu racismo. E cobrar dessa faixa da esquerda é uma tarefa árdua, pois devemos cobrar daquelas e daqueles que se dizem nossos parceiros de lutas, afinal, dos “bolsominions” já não podemos esperar nada. Mas se, de fato, essa esquerda quer construir uma revolução, terá que entender que ela também terá seus privilégios findados e que a população negra está disposta a mexer nessa ferida: ou são aliados ou não.

A revolução brasileira será negra e feminina, e já estamos entendendo quem está junto de verdade e quem não está. Quem não é parceiro vai ter a cara exposta, sim, pois não deixaremos mais falarem por nós quando queremos ter a nossa voz ativa.