Machismo, paternidade, periferia e Laura

A paternidade na periferia como um ato político e uma arma contra o machismo.

Pai é pai em qualquer lugar do mundo. Porém, assim como em todas as demais questões da vida social, exercer essa função enquanto favelado tem uma sabor especial, em razão de nossas dificuldades diárias de vivência e sobrevivência, em um país em que tudo depende do seu CEP.

O machismo nosso de cada dia poda os homens dentro das suas relações sociais; amigos não dizem “eu te amo”, homem não chora na frente de outra pessoa, pai não fala de sexo com filho(a). O machismo afeta até nosso bem maior, a paternidade. Não falo apenas do machismo “falado”, também do machismo estrutural de uma sociedade apoiada na (falsa) existência de uma hierarquia de homens para com as mulheres. Que entre tantas outras coisas, atrapalha o exercício da paternidade na sua potência máxima.

Obviamente, o machismo afeta muito mais a vida das mulheres que a dos homens, mas nós, como raízes desse problema, precisamos enxergá-lo e debatê-lo. Somos causa, conseqüência e vítimas desse mal.

Precisamos romper as barreiras e aproximar os laços afetivos. Arrebentar com as cordas de problemas sócio-culturais que nos impedem de avançar – machismo, LGTBfobia, racismo e misoginia (ódio, desprezo ou preconceito contra mulheres ou meninas. A misoginia pode se manifestar de várias maneiras, incluindo a exclusão social, a discriminação sexual, hostilidade, o patriarcado, ideias de privilégio masculino). Para isso precisamos quebrar o machismo estrutural que nos veda diariamente. Criarmos meninos e meninas de maneira igualitária. Se eu não quero que minha filha seja oprimida pelo marido, que ensine ela a ser empoderada e dona de si, porém, também ensine o meu filho a respeitar sua possível esposa dentro de uma relação justa para ambos. Mudamos o mundo, ao mudar o mundo ao nosso redor.

Obviamente, nós homens temos que estar sempre atento aos nossos privilégios, de como a vida é mais fácil quando se tem nosso gênero e de que isso tem que ser lembrado e pesado na hora de educar uma criança. Se é menino, que desde pequeno entenda que o mundo é machista quando não deveria ser, que o sexo que tem entre as pernas não o torna superior a nenhuma mulher. Se é menina, que entenda que o mundo é cruel com quem tem o gênero dela, mas que isso deve ser combustível para torná-la ainda mais forte e revolucionária.

Temos uma população sabotada pelo Estado, estando sempre no limite entre vivência e sobrevivência, inegável que isso influencia nas relações humanas, inclusive na paternidade. Ser pai é uma realização, a maior realização masculina possível sobre essa terra. Como dito por José Saramago “ser pai é um ato de coragem, porque se expõe a todo tipo de dor, principalmente da incerteza de estar agindo corretamente”.

Ser pai é esse carrossel de emoções, intensificado por nossas relações periféricas fragilizadas. Uma receita temperada entre a necessidade de sobreviver e o desejo de amar. A paternidade é um facho de luz em um mundo cada vez mais escuro e sombrio. Porém, como não se combate a escuridão com mais escuridão e sim com a luz, a violência dos dias atuais combateremos com amor, muito amor. E o ponto de partida é dentro de casa, com nossos filhos.

Em homenagem a minha já amada Laura, que essa semana chega para iluminar ainda mais minha vida e de seu, ansioso, irmão mais velho Arthur, que está louco de vontade para levá-la para fazer rolé pelas vielas do Jacarezinho.