Estudar ajuda muito a fazer um gol

Créditos: reprodução da internet

Adiei bastante a escrita deste texto. E ele se modificou a cada dia por motivos diferentes. A primeira ideia era falar sobre uma biografia lançada recentemente, sobre a vida da Carolina Maria de Jesus. Tanto o autor, Tom Alves, quanto a editora, Malê, representam forças renovadoras das questões ligadas à literatura negra brasileira. Este será o tema do próximo texto. Nossa Carolina, por si só, já é razão para muitos textos e muita leitura. Na dúvida, sempre é indicado ler Carolina. Seus livros Quarto de Despejo Díário de Bitita são pontos de partida para conhecer sua vida e toda a história de uma mulher valente, que decidiu desde cedo ser escritora e que, apesar de todas as dificuldades, realizou seu sonho.

O segundo texto seria ainda sobre literatura e, dessa vez, dando a notícia da publicação de um romance incrível e necessário para todos os cariocas, no mínimo. Da mesma editora, Malê, “O Crime do Cais do Valongo”, que eu recomendo que você leia, com urgência, tem seu enredo apresentado no site da editora:

“Um corpo amanhece em um beco, envolto em uma manta e com pequenas partes cortadas. O crime do cais do Valongo, de Eliana Alves Cruz, é um romance histórico-policial que começa em Moçambique e vem parar no Rio de Janeiro, mais exatamente no Cais do Valongo. O local foi porta de entrada de 500 mil a um milhão de escravizados de 1811 a 1831 e foi alçado a patrimônio da humanidade pela UNESCO em 2017. A história acontece no início do século 19 e é contada por dois narradores — Muana e Nuno — que conviveram com a vítima: o comerciante Bernardo Vianna.

https://www.editoramale.com/p roduct-page/o-crime-do-cais-do -valongo

Só no terceiro texto eu falaria de educação. E hoje, depois de assistir a alguns jogos, tive vontade de falar sobre como a ideia de “estudar” parece antiquada e como é preciso recuperar isso.

Minha vida de menina foi na periferia de São Paulo. Morava num bairro muito pobre, com várias famílias vindas do Nordeste para buscar uma situação melhor na metrópole. Por tudo que vivi, as piores estatísticas indicavam os meus caminhos. Mas o amor pelas palavras e o desejo de conhecer o mundo letrado me salvou.

Estudar parece uma coisa fora de moda. Estudar parece coisa de nerd, de CDF, de gente chata que não vê prazer nas “coisas boas da vida”. Estudar parece sem sentido. Mas é que as escolas, em geral, ensinam que estudar é mesmo um porre. Estudar, do jeito que ensinam, é realmente muito chato. Enquanto a vida acontece, com todas as alegrias e tristezas, prazeres e obstáculos, estudar parece algo muito estranho.

Já parou para pensar que, principalmente nos dias de hoje, em que praticamente todo mundo está viciado nas telinhas, estudar pode ser a grande jogada? Em tempos de Copa, já observou o momento de um pênalti, em que o goleiro e o jogador que vai chutar se olham? Eles levam algum tempo “estudando” um ao outro, tentando entender o que vai acontecer. E antes do jogo, com certeza, goleiros e jogadores “estudam” os modos como cada um atua. Cristiano Ronaldo deve ser um dos jogadores mais “estudados’ atualmente.

Quando queremos saber o significado de uma ação vale a pena pesquisar a origem da palavra:

“A palavra estudar vem de «estudo + –ar»; por sua vez, estudo deriva do «lat[im] studĭumĭī, “trabalh o, cuidado, zelo; vontade, desejo; favor, benevolência, ação de estudar; ocupação, profissão; doutrina, seita, escola; sala, gabinete de estudo; colégio, corporação”; (…); f[orma] hist[órica] sXIII studo, sXIV estudo, sXIV studio».

O verbo estudar significa, entre outras coisas, «aplicar o espírito, a inteligência e a memória para aprender (habilidade, técnica, ciência, arte etc.); adquirir habilidade e/ou conhecimento» ou «cursar aulas ou frequentar cursos».”

Mesmo que estudar seja também cursar aulas e frequentar cursos, como todos sabemos, há algo muito valioso nos sentidos da palavra ligados a uma decisão de “cuidar” e “zelar” em direção a adquirir um poder. Isso mesmo: adquirir poder sobre algo, entender, saber como funciona.

Seja lá o que for que você precise dominar, tem que haver uma ação de estudo (com foco nas habilidades necessárias para esta ação).

A vida exige “estudo” todo o tempo. O primeiro deles tem a ver com o desafio de nos conhecermos. Ali, no momento do pênalti, nas vezes em que a vida nos desafia, somos ao mesmo tempo o goleiro e o jogador.

Tem um ditado velho que diz: “a vida é dura para quem é mole”. Acho que não é simples assim, mas uma forma de driblar a vida é estudá-la. E os conteúdos sobre a vida estão em todos os lugares: na nossa casa, na nossa rua, nos livros, nos filmes, nas canções, nas histórias que ouvimos e compartilhamos. Como diz Guilherme Arantes: “cuide-se bem, perigos há por toda a parte e é bem delicado viver; de uma forma ou de outra, é uma arte, como tudo.”

Fazer da vida uma arte a seu favor é se proteger da ignorância. É adquirir o poder para fazer a diferença, para se livrar das jogadas dos adversários. Estudar a vida, estudar a si mesmo, estudar as várias formas de ser e estar no mundo. A começar pelo seu mundo: sua alma, sua mente, seu coração.

Refaça o caminho. Faça as pazes com o estudo. E olhe bem de frente para a cara do goleiro. A vitória não está garantida. Nunca está. Mas o resultado será muito melhor se você estiver preparado