A Pena Privativa de Liberdade: um mito a ser desconstituído.

       Noções Introdutórias.

                   O presente trabalho aborda a pena privativa de liberdade sob vários aspectos. Demonstra, não só, a cristalina disparidade entre o que prevê a Constituição da República, as demais leis infraconstitucionais e a realidade fática da aplicação da pena privativa de liberdade no Brasil, mas, também, a irracionalidade de discursos que pretendem legitimar o poder punitivo, atribuindo-lhe finalidades preventivas e educativas que, contudo, não passam de uma grande falácia.

                      Através do estudo de teorias e posições diferenciadas comprovar-se-á a ineficiência da pena privativa de liberdade que, a pretexto de tutelar a segurança da sociedade, promete integração, mas tem efeito propulsor de exclusão, criminalidade e violência, bem como a necessidade premente de buscar alternativas a ela, que estejam efetivamente em consonância com a Carta Magna.

                      Sob uma ótica crítica, desprovida de hipocrisia e preconceito, demonstrar-se-á, não só, a necessidade, como os benefícios de uma política criminal comprometida  com o bem estar de todos os cidadãos (desviantes e não desviantes) e, portanto, devidamente adequada à Carta Constitucional.

                   Capítulo 1 – A pena de privativa de liberdade.

                1.1 – Conceito, previsão legal.

                    Na precisa lição de Heleno Fragoso, a pena encontra seu fundamento no dever que incumbe o Estado de preservar a ordem e a segurança da convivência social, que deflui de sua função de tutor e mantenedor do ordenamento jurídico. Isso se faz com a incriminação de certas condutas que mais gravemente atingem certos bens e interesses[1]. A pena é a perda de bens jurídicos imposta pelo órgão da justiça a quem comete crime, sendo, no caso da pena privativa de liberdade, o condenado privado temporariamente do seu direito de ir e vir. Sanção característica do direito penal, cominada ab malum actionis[2], em sua essência retributiva[3].

                    A pena privativa de liberdade prevista nos artigos 32 e 33 do Código Penal, nas espécies detenção (está pode ser cumprida nos regimes semiaberto e aberto) e reclusão (que pode ser cumprida nos regimes fechado, semiaberto ou aberto). Tem o limite máximo de cumprimento de 30 anos estipulado pelo artigo 75 do mesmo diploma legal e sua execução regulada pela Lei de Execução Penal.

               1.2 – A pena privativa de liberdade e os direitos e garantias fundamentais.

                   Ao lado do direito de punir do Estado soberano, caminha o direito à liberdade. O Estado de Direito reconhece a liberdade não só como um direito, mas como uma regra, que só pode ser restringida em última hipótese e mediante a aplicação efetiva de diversos direitos e garantias, verdadeiro freio à soberania estatal. Não é por menos que a Constituição, no artigo 5º, tutela a restrição de liberdade, provisória ou definitiva, com inúmeros direitos e garantias fundamentais nos incisos: III, XXXVII, XL, XLV, XLV, XLVI, XLVII, XLVIII, XLIX, LIII, LIV, LV, LVI, LVII, LXI, LXII, LXII, LXIV, LXV, LXVI e LXVII. Contudo, analisar-se-á, com vistas a alcançar especificamente o objetivo pretendido no presente trabalho, apenas as garantias fundamentais à pessoalidade e humanidade da pena, conceituando-as.

                  O princípio da intranscendência da pena, previsto no artigo 5º, XLV da Constituição da República, traz a garantia fundamental de vedação à transcendência do poder punitivo a terceiros. Como dizem Raúl Zaffaroni e Nilo Batista: “No Estado de Direito a responsabilidade penal deve ser individual e não transcender a pessoa do delinquente”[4].

                  O princípio da humanidade da pena, previsto no artigo 5º, XLVII da Constituição Federal, veda expressamente as penas de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do artigo 84, XIX da CF, de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento e cruéis. A limitação ao poder punitivo em tela, decorrente do princípio da dignidade da pessoa humana, epicentro da ordem jurídica, prevista no artigo 1º, III da Constituição Federal, como valor fundamental do Estado Social Democrático, deve – tem que – ser interpretada de forma extensiva – como garantia fundamental que efetivamente é, ou seja, qualquer pena que possa ser entendida como cruel deve e tem que ser expurgada do ordenamento jurídico, sob pena de ferir-se a própria essência da Constituição.

       Por se tratar de questão própria de direitos dos seres humanos, direito à vida e à liberdade, a sanção penal deve ser analisada, também, sob a ótica de documentos internacionais específicos para tratamento do apenado. Dentre estes documentos destacam-se dois em especial: a Convenção Americana de Direitos Humanos e a “Declaração da ONU sobre regras mínimas para tratamento de detentos”.

                    A Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto San José da Costa Rica) prevê, em seu artigo 5º, o Direito à integridade pessoal declarando que tanto a integridade física quanto a psíquica e moral devem ser respeitadas, não permitindo submissão a torturas, nem penas cruéis ou tratamentos desumanos ou degradantes. A base desta declaração diz respeito a um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, a dignidade da pessoa humana.

                     Na lição de Juarez Cirino, “o princípio da humanidade da pena não se limita a proibir a abstrata cominação e aplicação de penas cruéis ao cidadão livre, mas proíbe também a concreta execução cruel de penas legais ao cidadão condenado”[5]. A execução de uma pena que, de alguma forma, deprecie a dignidade da pessoa humana esbarra com a limitação instituída pela Constituição Federal. Raciocínio pautado na indisponibilidade da vida, liberdade e dignidade da pessoa humana.

                       Renato Marcão, com fundamento nos artigos 38 e 92 do Código Penal, bem como no 3º da Lei de Execução Penal, ensina: “todos os direitos não atingidos pela sentença criminal permanecem a salvo”[6]. Além da perda da liberdade há previsão legal de suspensão dos direitos políticos (art. 15, III, da Constituição Federal), eventual suspensão de poder familiar (arts. 394 do Código Civil e 92, II, do Código Penal), eventual perda de cargo, função pública ou mandato eletivo (art. 92 do Código Penal), mas nenhuma previsão de perda do direito a um tratamento condizente com a dignidade da pessoa humana.

                       1.3 – Finalidades da pena – Teorias legitimantes do poder punitivo.

                        As teorias legitimantes reconhecem, sob os mais diversos fundamentos, legitimidade ao Estado para intervir na liberdade dos cidadãos por meio do direito penal. São três as principais teorias: absoluta, relativa ou preventiva e mista ou unificadora.

                       Para as teorias absolutas a pena se funda na justa retribuição, tem um fim em si mesma e não serve a qualquer outro propósito que não seja o de recompensar o mal com o mal[7]. Nesse sentido são as teorias de Kant – teoria da retribuição de ordem ética – e de Hegel – teoria da retribuição de ordem jurídica.

                      Para as teorias relativas ou preventivas, a pena não visa retribuir o fato delitivo cometido e sim prevenir sua prática[8] A função preventiva da pena dividi-se em prevenção geral e especial. A prevenção geral fundamenta-se em duas ideias básicas: a ideia da intimidação ou da utilização do medo, e a da ponderação da racionalidade do homem [9]. A intimidação é exercida através da ameaça da pena – isto é, com a criminalização de certas condutas e a consequente cominação legal de penas – e de sua efetiva imposição, atemorizando os possíveis infratores. A prevenção especial atua sobre o autor do crime, para que não volte a delinqüir. Opera através da emenda do condenado ou de sua intimidação, ou, ainda, da “inocuização”[10] dos considerados incorrigíveis, ou seja, anulando aqueles apenados que não são capazes de voltar ao convívio social.

                          A teoria mista ou unificadora agrupa em um conceito único os fins da pena. Esta corrente tenta recolher os aspectos mais destacados das teorias absolutas e relativas[11] que se pautam, respectivamente, pelos critérios da retribuição e da prevenção.

                           Segundo Rogério Greco[12], em razão da redação contida no caput do artigo 59 do Código Penal, pode-se concluir pela adoção, em nossa lei penal, de uma teoria mista ou unificadora da pena.  Na lição de Renato Marcão, “a execução penal deve objetivar a integração social do condenado ou do internado, já que adotada a teoria mista ou eclética, segundo a qual a natureza retributiva da pena não busca apenas a prevenção, mas também a humanização” [13]. Tais expectativas são questionáveis diante da realidade brasileira.

                          1.4- O discurso falacioso das teorias legitimantes.

                         Unificar teorias que têm funções conflitantes não resolve o problema dos defeitos que cada uma traz particularmente. A unificação não alcança a superação das debilidades de cada teoria, pelo contrário, soma os defeitos.  Unir as funções de retribuição e de prevenção (especial ou geral), além de demonstrar a insuficiência do método punitivo retributivo, funciona como meio hábil a disfarçá-lo como forma de prevenção[14].

                          Atualmente, há quem sustente a aplicação da pena de prisão como única forma de proteger a sociedade do cometimento de delitos futuros, legitimando sua aplicação com fundamento na prevenção geral ou na prevenção especial.

                           O poder punitivo do sistema penal é exercido através de um processo de criminalização seletivo, divido em criminalização primária (elaboração das leis) e criminalização secundária (exercida sob pessoas concretas, que tem início com a prisão em flagrante delito ou investigação do suspeito e estende-se até a imposição de uma pena).[15]

Na lição de Raúl Zaffaroni e Nilo Batista a inevitável seletividade operacional da criminalização secundária (sobre pessoas sem poder e por fatos grosseiros e até insignificantes ) provocam uma distribuição seletiva em forma de epidemia, que atinge apenas aqueles que têm baixas defesas perante o poder punitivo[16].

                             Uma criminalização que seleciona as obras toscas da criminalidade estimula o aperfeiçoamento criminal do delinqüente, ao invés de dissuadi-lo a não delinquir, estabelece maior nível de elaboração delituosa como regra de sobrevivência para quem delinque [17].

                               No que concerne à prevenção especial – finalidade educativa – não  pode ser outra a conclusão: não há como reeducar, ressocializar ou humanizar o apenado retribuindo-lhe o mal causado. O caráter retributivo da pena e a finalidade educativa são incompatíveis entre si e esta incompatibilidade advém da essência de dois mecanismos completamente diversos: são como água e óleo.

                         A pena privativa de liberdade é aplicada coercitivamente a alguém que em regra, cometeu um delito, portanto, violenta em sua essência – porque é imposta contra a vontade do indivíduo em retribuição ao mal perpetrado – e essa violência se agrava obviamente no decorrer do cumprimento da pena, já que o estabelecimento prisional fica encarregado de manter essa privação de liberdade coercitiva durante o tempo estipulado na sentença condenatória – com as alterações advindas das regras para progressão de regime – impedindo qualquer tentativa de fuga. Não há como educar e humanizar alguém quando o método utilizado é aflitivo, violento e doloroso. Não se ensina o respeito mútuo violentando desrespeitosamente os direitos do educando. A única reforma que pode ser auferida com a retribuição do mal é a negativa, que perverte e deteriora o ser humano aprisionado.

                         A união de distintas e contraditórias finalidades, variantes da finalidade defesa social, “na prática, traduz-se em uma pluralidade de discursos legitimantes que permitem “racionalizar” qualquer decisão, através tão-somente da escolha do discurso mais apropriado entre os que são apresentados“ [18]. Neste diapasão, as finalidades da pena são flexibilizadas e quando as ideologias “re” fracassam, apela-se para uma espécie de neutralização diferenciada do condenado (dedicada a corrigir aqueles entendidos como incorrigíveis e indisciplináveis), com a instituição de regimes de cumprimento de pena, (como, por exemplo, o regime disciplinar diferenciado)[19] contrários a qualquer finalidade educativa e que, de há muito, haviam sido considerados desumanos.

                        Punir e garantir a segurança pública são as finalidades precípuas e, na prática, independentemente do discurso legitimante escolhido, a retribuição do mal, entendida como meio, torna-se fim[20].

                         Desde 1990, Heleno Fragoso discorria sobre o insucesso da pena de prisão no que concerne as finalidades educativas, bem como preventivas[21].  A finalidade preventiva da pena – seja geral ou especial – é uma grande falácia que serve apenas como meio hábil a justificar o fim retributivo da pena, atribuindo a esta as qualidades de ética e humana. Fruto de uma época em que se necessitava humanizar a pena, travestindo seu conteúdo talional em meio apto a prevenir delitos e educar, traz a vingança em sua essência, com fundamento na defesa social.

                          A pena de prisão é a violência a serviço do controle da violência servindo, apenas, para acalmar os ânimos de uma sociedade que clama por punições severas, mas ignora seu caráter aflitivo e doloroso, sua história e a própria origem da palavra, vinda do latim poena que, por sua vez, vem do grego poné – vingança. A pena de prisão não tem o condão de operar qualquer reforma positiva no apenado, tampouco de frear a criminalidade. É impressionante como, até hoje, há quem atribua o efeito mágico da prevenção – geral ou especial – à pena, o que se percebe não ser verdadeiro na realidade social brasileira, devido o aumento da criminalidade e superlotação carcerária, notoriamente conhecida.

                         Capítulo 2 – A legalidade e a legitimidade da pena de prisão.

                       2.1 – A vedação às penas de caráter desumano e a transcendência da pena do prisma da realidade do sistema prisional.

                        Como foi dito, a aplicação da pena de prisão está sob manto dos direitos e garantias fundamentais, previstos na Carta Constitucional, inerentes a todo ser humano. Contudo, não é esta a realidade fática do sistema prisional e, consequentemente, do cumprimento da pena privativa de liberdade.

                          As unidades prisionais são insalubres, as condições de higiene são péssimas, facilitando o desenvolvimento de doenças infectocontagiosas e, consequentemente, a contaminação de um elevado número de detentos. Sarna, viroses de todos os tipos, tuberculose e doenças sexualmente transmissíveis são comuns dentro das unidades prisionais, bem como a infestação por ratos e todos os tipos de insetos e parasitas. A ventilação nas acomodações é precária e, na maioria das unidades, os sanitários – buracos no chão – ficam localizados dentro da cela, ou na razão de um – obviamente coletivo – por galeria (informação verbal)[22]. A superlotação é um problema constante e aparentemente insolúvel, cabendo salientar que no ano de 2010 o total de pessoas encarceradas no Brasil chegou a 498500 [23].

                        Nas carceragens da polícia civil, que a princípio serviriam apenas para abrigar presos provisórios, a realidade é bem pior. A superlotação não desaparece, pelo contrário, é agravada. Celas que serviriam para acautelar no máximo trinta detentos têm setenta e presos provisórios ficam acautelados na mesma cela que os definitivos. Na carceragem de Neves, em São Gonçalo, RJ, durante o verão deste ano, a temperatura no interior das celas chegou a 57 graus[24].

                         As regras mínimas para o tratamento de prisioneiros adotadas pelo 1º Congresso das Nações Unidas sobre prevenção do crime e tratamento do delinqüente ( números 8 a -d;  9, 1 e 2; 10 a-b; 11 a-b; 12 e 13) estão longes de serem cumpridas. As unidades prisionais no Brasil, como bem disse Guilherme de Souza Nucci, assemelham-se a “autenticas masmorras”[25]. Depósitos de gente, mas não de qualquer tipo de gente e sim da escória da humanidade, gente pobre, marginalizada, esquecida e detestada que a sociedade faz questão de manter afastada.  Os estabelecimentos prisionais notoriamente superlotados “chegam a lembrar campos de concentração [26]”.

                         O tratamento dirigido ao condenado não é menos degradante, mas, infelizmente, é parte inseparável de um sistema orientado para punir infringindo sofrimento. É inerente ao funcionamento do sistema, criado para evitar fugas e, por conseguinte, manter o apenado longe da sociedade. Segurança e ordem são fins precípuos[27] de todas as unidades prisionais. Qualquer tentativa de humanizar o sistema – por parte de quem nele labora – pode ocasionar desastrosas conseqüências. Não se pode olvidar a grande responsabilidade dos diretores e funcionários de um sistema que só desperta atenção da sociedade quando há rebelião e fuga, trazendo temor e pânico à população subjetivada pela mídia e, consequentemente, orientada a temer os supostos inimigos públicos.

                         Esse funcionamento, previamente determinado e mecânico do sistema prisional, exige o cumprimento de regras disciplinares rígidas por parte do apenado, demandando um controle imperioso a ser exercido pelos funcionários. Neste diapasão, são suprimidos direitos não atingidos pela sentença condenatória, como o direito a intimidade e, até mesmo, o de ser tratado como fim e nunca como coisa ou meio – necessário à manutenção de uma suposta (e inalcançável) segurança, ou seja, o direito a receber tratamento condizente com a dignidade da pessoa humana.  Finalidades  educativas e culturais que possam de alguma forma trazer perigo a segurança do estabelecimento são postergadas ad aeternum. O apenado tem suprimida sua autonomia e seu direito de fazer escolhas, suas opções são minuciosamente regradas, explicadas, mas não justificadas, de forma que o cumprimento é obrigatório, mas não pode ser questionado, ou sequer, analisado[28].

                          Não se pode esquecer que a Lei de Execução Penal foi elaborada e entrou em vigor no fim da Ditadura Militar. A natureza violenta, totalitária e autoritária da prisão jamais foi dissociada da pena privativa de liberdade, pelo contrário, está tão arraigada a sua essência que qualquer tentativa de desvinculá-la será inútil. Como bem asseverou Maria Lúcia Karam “a linguagem da Ditadura se faz presente na definição legal da primeira das faltas disciplinares qualificadas como graves, descrita como “incitar ou participar de movimento para subverter a ordem ou a disciplina”[29]. Data vênia, não é só a linguagem da ditadura militar que se encontra presente na execução da pena de prisão, muitos de seus costumes se repetem até a atualidade, demonstrando nitidamente que  para quem cumpre pena no sistema penitenciário não há Democracia.

                      Privado da convivência familiar, submetido a um regime totalitário e asfixiante, o apenado vê-se desprovido de direitos, humilhado, tem a sensação de que pertence a escória da sociedade e acaba aderindo ao ambiente carcerário que não está restrito às regras disciplinares da Lei de Execução Penal e do Regimento Interno da Secretaria de Administração Penitenciária, vigorando, em concomitância àquelas, um conjunto de normas – uma espécie de código de conduta intramuros (oriundo de um sistema social interno), sem o qual a sobrevida na prisão tornar-se-ia impossível. Porém, este sistema social não é uma miniatura da sociedade livre e sim um sistema próprio, com regras peculiares, fins e cultura particular[30], criados pelos próprios em prol de uma convivência pacífica no cárcere.

                       Este conjunto de regras, instituído pelos detentos, – independentemente do grupo carcerário o qual pertençam – traz um código de honra e considerações éticas inversas às regras da sociedade, transmuta valores, oferecendo uma ilusória, mas aparentemente legítima, luta por justiça social, bem como procura pela paz, só que de forma violenta. Atrai grande parcela dos apenados, que acabam encontrando afinidades com esta sociedade interna, se vendo compelidos a unir-se a determinados grupos carcerários, aderindo, efetivamente, ao mundo do crime, em busca de proteção e estabilidade econômica.

Apesar da deficiência dos dados estatísticos, é inquestionável que a delinqüência não diminui em toda a América Latina e o que o sistema penitenciário tradicional não consegue reabilitar o delinquente; ao contrário, constitui uma realidade violenta e opressiva e serve apenas para reforçar os valores negativos do condenado (BITENCOURT, 2004, p. 161) [31].

                         O cotidiano do cárcere favorece esse aspecto criminógeno da prisonização justamente porque permite e alimenta diariamente a efetiva eficácia das ditas regras “intramuros”, no exato momento que retira do apenado compulsoriamente o direito a receber um tratamento condizente com a dignidade da pessoa humana.  A disparidade entre a previsão legal e a realidade fática do sistema prisional é cristalina, dissemina insegurança jurídica e, consequentemente, descrédito na Justiça, na população carcerária – entendida não só como o conjunto de apenados, bem como suas famílias.

                        A família do detento recebe o mesmo tratamento dirigido a ele, vê-se marginalizada, excluída, humilhada, perde totalmente a confiança na Justiça – lato sensu. Desde a primeira entrada em um estabelecimento prisional a família do apenado descobre que não é bem vinda, é tratada com hostilidade pelos funcionários, é submetida a uma revista vexatória e humilhante[32] – que obriga o visitante a ficar nu e aceitar uma eventual, mas possível busca nas cavidades corporais que se assemelha a um exame ginecológico – tem que enfrentar dificuldades inúmeras, tais como filas enormes, onde dormem, tendo que chegar cedo para poder pegar uma senha, tendo, ainda, que fazer uso das dependências anti-higiênicas e insalubres dos estabelecimentos prisionais.

                             Todos estes fatores são peças de um mesmo mecanismo desumano e criminógeno: a prisão.  A pena de prisão que não pode ultrapassar a pessoa do condenado – por força do princípio da pessoalidade da pena – e que deve ser humana – em razão da vedação às penas cruéis e desumanas, acaba, na realidade, atingindo, de forma desumana e cruel, não apenas a ele, mas também a sua família, que é seu alicerce e deveria ser inatingível por qualquer consequência advinda da pena a ele aplicada, transformando-a em uma população invisível (a expressão é de Simone Menezes)[33] – dada a quantidade de famílias que têm um ente querido privado da liberdade – que vive a margem da sociedade, humilhada e excluída.

                              2.2 – A pena de prisão e a legalidade penal – Estado de Direito ou Estado de Polícia.

                              Diante da narrativa supra, não pode ser outra a conclusão: o sistema penitenciário faz tabula rasa dos direitos e garantias fundamentais, trazendo a tona uma questão de suma importância, qual seja, a legalidade da pena privativa de liberdade. Como pode ser classificado um sistema prisional que vai de encontro ao que prevê a Carta Constitucional?  O que dizer de uma pena que é executada sem que sejam respeitados direitos e garantias fundamentais, senão que é ilegal, quando desumana, degradante e cruel.

                          Não é só o sistema prisional – instalações, funcionários, diretores e regras – que agride a Constituição da República. Estamos atravessando um momento de expansão do poder punitivo, na qual “autoritárias legislações de emergência ou de exceção são sistematicamente produzidas, abandonando princípios garantidores” (KARAM, Maria Lúcia, 2009, p.130)[34]. Vive-se uma época na qual se legitima a punição desprovida de legalidade, com fundamento na defesa social. A estrutura do Estado de Direito é mantida, mas o Estado Policial sobrevivente vai sendo reforçado[35] e acaba, por muitas vezes, superando o próprio Estado de Direito. Com a devida vênia, a pena que deveria ser condicionada a direitos e garantias fundamentais previstos na Lei Maior – inerentes a todo e qualquer ser humano – é arbitrariamente condicionante à finalidade de defesa social e, neste diapasão, são aplicadas costumeiramente penas privativas de liberdade, em desconformidade com o que prevê a Carta Constitucional, de forma absurdamente legal.  Ora, há a previsão legal da possibilidade de aplicação da pena privativa de liberdade, mas esta deve possuir qualidade e quantidade compatíveis com a dignidade da pessoa humana, do contrário estar-se-á não só violando a garantia fundamental da humanidade da pena como o próprio fundamento do Estado de Direito.

                            A legalidade penal não se limita a exigir a lei como condição necessária da pena e do delito (nulla poena, nullum crimen sine lege), mas, também, qualidade e quantidade compatíveis com o estabelecido pela Lei Maior[36].  Isto porque, segundo Luigi Ferrajoli (2010, p. 93), “o princípio da legalidade estrita exige todas as demais garantias como condições necessárias da legalidade penal (nulla lex poenalis sine necessitate, sine injuria, sine actiona, sine culpa, sine judicio, sine accusatione, sine probatione, sine defensione)”[37].

                             Toda pena aplicada, em concreto, que se torne cruel, desumana, porque degradante e incompatível com a dignidade da pessoa humana, ou que ultrapasse a pessoa do delinquente, impondo consequências humilhantes, vexatórias e estigmatizantes à família do apenado é arbitrária, porque agride cristalinamente a forma prevista em lei – no sentido de ser desumana e parcialmente transferida à família do apenado (além de violar diversos outros direitos e garantias) – para o exercício do poder punitivo. O Estado de Direito não pode anuir com a aplicação de uma pena notoriamente em desconformidade com a Constituição da República e demais leis infraconstitucionais. Quando o faz deixa de ser Estado de Direito e passa a ser Estado de Polícia.

                              2.3 A pena privativa de liberdade e a vingança coletiva – desconstituindo o mito.

 

                              A condenação de um indivíduo, acusado de perpetrar um crime brutal ou infame exposto na mídia, provoca uma espécie de efeito paliativo sobre a população, acalmando-a, satisfaz o desejo de vingança inerente a esta espécie de reclamo punitivo. O tempo demasiadamente longo de prisão assume a posição de fetiche no inconsciente coletivo da sociedade, orientada por escusos desejos talionais, – no sentido de retribuição – que vibra por cada ano a mais na condenação.  Por maior que seja o absurdo desta assertiva, do ponto de vista jurídico, é verdadeira e merece especial atenção.

                              Não se está defendendo a aplicação da pena de prisão com fundamento na famigerada finalidade de evitar a vingança privada, pelo contrário, o objetivo pretendido é demonstrar racionalmente a necessidade de repensar-se a pena de prisão em todos seus aspectos, incluindo suas finalidades, no sentido de entendê-la em sua essência talional, – porque advém em razão do cometimento do delito e em retribuição a este – falaciosa, no que tange ao discurso legitimante, inútil e irracional no que tange as finalidades almejadas pela Lei de Execução Penal. Independentemente de qualquer argumento humanitário, é necessário encarar o insucesso do sistema penal do ponto de vista utilitário. Manter uma punição que estimula a delinquência ao invés de reprimi-la porque produz uma espécie de efeito calmante sob a população é uma aberração jurídica. É preciso desconstituir o mito da pena de prisão no inconsciente coletivo da população. É necessário expurgar o desejo de vingança de qualquer tipo de pena – no sentido de punição – que venha a ser instituída atual ou futuramente.

                                A punição almeja vingar a sociedade ou estabelecer a paz e a segurança desta? “Um Estado que mata, que tortura, que humilha um cidadão não só perde qualquer legitimidade, senão que contradiz sua razão de ser, colocando-se no nível dos mesmos delinqüentes”[38](FERRAJOLI, 2009, p. 364).

                               A legitimidade da aplicação da pena de prisão, como punição e em retribuição à prática do delito, advém da ideia de manutenção do bem estar da sociedade (como um todo). No momento que esse discurso perde a legitimidade frente à realidade social, a ideia de bem estar social inexiste justamente porque não é – e não será – alcançada. Ora, se não é possível proporcionar segurança à população (não desviante) e prevenir a ocorrência de futuros delitos com a aplicação da pena privativa de liberdade, tampouco dar efetividade às disposições legais, no que tange aos direitos de quem está privado da liberdade, a quem diz respeito este bem estar social?

                                   Capítulo 3 – A caminho de um Estado de Direito.           

                                 3.1- A teoria negativa da pena de E. Raúl Zaffaroni e Nilo Batista e o abolicionismo penal.

                                  Para Raúl Zaffaroni e Nilo Batista o jus puniendi exercido pelo sistema penal orienta-se de acordo com um processo seletivo de criminalização que ocorre em duas etapas. Primeiramente o poder legislativo sanciona leis penais criminalizando condutas (criminalização primária), em um segundo momento, o poder punitivo é exercido em concreto sob determinadas pessoas que serão investigadas, processadas e apenadas (criminalização secundária) pelas agências policiais (que selecionam quem será efetivamente investigado ou preso), promotores, juízes, advogados, defensores e etc[39]. Destacando a arbitrariedade seletiva, a corrupção institucionalizada, a verticalização social como algumas das características estruturais do exercício de poder punitivo do sistema penal, os autores defendem a posição que recusa legitimidade ao Estado para exercer o poder punitivo, identificando-o como “um capítulo do modelo de estado de Polícia que sobrevive dentro do estado de direito”[40].

                                 Os discursos legitimantes do poder punitivo, como foi demonstrado no capítulo 1 (itens 1.3 e 1.4) deste trabalho, estão deslegitimados frente aos dados das ciências sociais e a genialidade de Raúl Zaffaroni e Nilo Batista brindou-nos com a teoria agnóstica da pena (teoria negativa da pena) segundo a qual: “Um conceito negativo ou agnóstico de pena significa reduzi-la a um mero ato de poder que só tem explicação política”(2006, p. 108.)[41].

                               “Com base nesta teoria negativa do poder punitivo e da pena o direito penal fica livre para elaborar elementos orientadores de decisões que reforcem a segurança jurídica, entendida como tutela dos bens jurídicos”[42] (ZAFFARONI, 2006, p. 111), mas, não apenas dos bens jurídicos da vítima – que na verdade não são tutelados, mesmo nos poucos casos selecionados pela criminalização secundária – e sim de todos os cidadãos – entendidos como seres humanos – desviantes e não desviantes, exercendo o poder jurídico de limitação do poder ilimitado das agências do sistema penal[43].

                               O abolicionismo nega não apenas a legitimidade do sistema penal contemporâneo, bem como a legitimação de outro sistema penal futuro[44]. Postula “a abolição radical dos sistemas penais e a solução dos conflitos por instancias ou mecanismos informais” [45](ZAFFARONI, 1991, p. 89).

             

                               3.2 – A abolição das prisões e do sistema penal na posição de Maria Lúcia Karam.   

                                Karam ressalta a monstruosidade da pena privativa de liberdade[46], aduzindo ser necessário “afastar a hipocrisia e insensibilidade”[47](KARAM, 2009, p. 125) que a cerca, para que se possa compreender o verdadeiro significado da privação de liberdade. Conduzindo os sentimentos para a vida no cárcere, entendendo a dor e aflição dos que padecem nas prisões, “esforçando-nos por imaginar a infinita dor das pessoas que sofrem a pena”[48] (KARAM, 2009, p. 125), deixando de lado a “ indiferença, os preconceitos, as abstratas idéias que privilegiam a “ordem” e a “segurança”[49] (KARAM, 2009, p. 125).

                                Para esta jurista, a privação de liberdade é inútil e desumana. Posicionando-se a favor da abolição das prisões e do próprio sistema penal, defende, enquanto isso não for possível, a necessidade de reivindicação de medidas que atenuem o sofrimento e os “danos provocados pelo poder punitivo”[50](KARAM, 2009, 132 – 135), sugerindo soluções que poderiam contribuir para a resolução do problema da superlotação carcerária, bem como frear o crescimento da pena privativa de liberdade em todo o mundo, quais sejam: anistia global para todos os condenados por crimes praticados sem violência real contra a pessoa, para todos os condenados maiores de sessenta anos e para todos aqueles portadores de doenças graves – independentemente do tipo de delito ou quantidade de pena – e uma comutação das penas dos demais em ao menos 1/3 de seu total.  Defende, também, a regulamentação da produção, distribuição e consumo de substâncias psicoativas, asseverando que a principal causa do crescimento das prisões em todo o mundo é a criminalização das condutas relacionadas ao consumo e à distribuição destas substâncias[51].

                                Corroborando a posição da autora, tem-se a estatística trazida por Orlando Zaccone, revelando que as pessoas que respondem processos pela prática de crimes relacionados à Lei de Drogas ou que estão condenadas por estes delitos representam 60% da população carcerária[52], o que demonstra a ineficácia de uma política criminal que, mais uma vez, tem a defesa social como fundamento, mas, de modo antagônico ao pretendido, dissemina a violência e a exclusão.

                               Até quando insistiremos na criminalização da distribuição, produção e consumo de substâncias psicoativas? Até quando assistiremos o encarceramento e o extermínio de jovens pobres, que vêem na venda de substâncias psicoativas a saída para uma vida minimante digna.

                              

                                 3.3 – O rastreamento eletrônico como alternativa à prisão, na posição de Túlio Lima Vianna.  

                                 Túlio Vianna defende o uso de equipamentos eletrônicos de rastreamento como alternativa à prisão. Para este autor toda pena sempre terá um caráter aflitivo e “o rastreamento eletrônico não tem qualquer propósito de revolucionar o modo de punir”[53] (2010, p. 1017), porém, apesar “do seu caráter aflitivo, é um mal menor que a prisão”  que, além de não ressocializar o apenado, “é um relevante fator criminógeno” [54](VIANNA, 2010, p.1017). O autor se posiciona contra o projeto de Lei 1.288/2007 que, “longe de utilizar o rastreamento eletrônico como uma opção descarcerizante, optou por uma política criminal bastante conservadora”[55]( 2010, p 1017), endurecendo a Lei de Execução Penal ao prever a possibilidade do Juiz da Execução condicionar a saída temporária, a concessão da progressão de regime para o aberto e o livramento condicional ao uso do sistema de rastreamento eletrônico[56].

                                  Contudo, o jurista defende a utilização do rastreamento eletrônico como alternativa à prisão, com base em uma política criminal efetivamente comprometida com a melhoria do sistema carcerário brasileiro, asseverando que o legislador poderia ampliar as hipóteses de prisão domiciliar, criar a prisão domiciliar noturna, permitindo o trabalho diurno a o recolhimento noturno na própria residência, mediante o uso do aparelho citado. Poderia, ainda, permitir a limitação de fim de semana a ser cumprida na própria residência do condenado, a proibição de frequentar certos lugares, bem como utilizar o aparelho para impedir a proximidade de suposto agressor em muitos casos de violência doméstica e como alternativa à segregação cautelar, entre outras possibilidades[57].

                                 O uso do rastreamento eletrônico como opção ao cárcere, além de desafogar o superlotado sistema prisional e representar uma economia de recursos no que tange aos gatos com estabelecimentos prisionais voltados para o cumprimento de pena em regimes semiabertos e abertos, bem como casas de custódia, apresenta maiores chances de reinserir o condenado na sociedade, pois possibilita o cumprimento da pena ou, pelo menos, uma parte dela,  inserido na mesma.

                                 3.4 – O direito penal mínimo de Luigi Ferrajoli.

 

                                  Este autor defende um direito penal mínimo, enquanto técnica de tutela dos direitos fundamentais, traçando um modelo normativo de justificação, que volta o direito penal para o único objetivo da prevenção geral negativa.  Pretende tutelar[58], além do “máximo bem estar possível dos não desviantes, o mínimo mal estar necessário dos desviantes” (2009, p. 308)[59]. Defende como finalidade do direito penal, uma dupla função preventiva negativa da pena, qual seja: “a prevenção geral dos delitos e a prevenção geral das penas arbitrarias ou desmedidas”[60] (2009, p. 310).

                                  Para Ferrajoli os princípios da necessidade e de respeito à pessoa (dignidade da pessoa humana) são os critérios complementares, que correspondem aos fins da pena, por ele atribuídos. Defende, ainda, que a formalização legal da pena é um pressuposto essencial também para sua minimização, conforme o critério: nulla poena sine necessitate, isto porque os argumentos de defesa social (prevenção dos delitos) são eficientes para sugerir o limite mínimo, mas insuficientes para fundamentar o limite máximo das penas[61]. Acrescenta: “o valor da pessoa humana impõe uma limitação fundamental em relação à quantidade e à qualidade da pena” (FERRAJOLI, 2009, p. 364)[62].   Deste argumento, resulta a assertiva de que toda pena – no que concerne à qualidade e quantidade – maior do que a mínima necessária para reprimir reações punitivas informais para o acusado ou apenado, pode ser entendida como violadora da dignidade da pessoa humana[63], fundamento do Estado Democrático de Direito, e, por conseguinte, da garantia fundamental à humanidade da pena.

                                 Coerente com sua proposta, Ferrajoli postula a abolição das penas privativas de liberdade demasiadamente extensas, suprimindo-as com a fixação de um limite máximo de prisão mais baixo.  “Qualquer estratégia de humanização das penas supõe, com a abolição das que em cada momento se manifestem intoleráveis para a consciência cívica, a defesa da forma legal da pena” (2009, p. 380)[64]. Desta forma, a pena de prisão teria seu patamar máximo diminuído para 10 anos[65].

                                  O tempo de prisão e, consequentemente, a vedação às penas de caráter perpétuo é um tema delicado. Alvo do Projeto de Lei nº 310 de 1999, que pretende elevar o limite máximo de 30 anos, objeto de o verbete sumular 715 do STF – que desconsidera o limite máximo de cumprimento de pena estabelecido no artigo 75 do Código Penal, para fins de cálculo da fração de pena e efeito de progressão de regime. O tempo de cumprimento da pena privativa de liberdade é relativizado, em diversos julgados que privilegiam uma pretensa segurança social, em detrimento da vedação às penas de caráter perpétuo, flexibilizando-a para adequá-la a uma política criminal conservadora e ultrapassada. Foi por defender a supremacia da Carta Constitucional, no que tange a vedação às penas de caráter perpétuo, que a 5ª Câmara Criminal do RJ, no Habeas Corpus nº 2008.059.02057, manifestou entendimento diverso do sumulado pelo Supremo, com fundamento justamente na vedação às penas de caráter perpétuo (artigo 5º, inciso XLVII, alínea b), senão vejamos:

Princípio da individualização da pena que se orienta no sentido da liberdade, isto é, toda pena privativa de liberdade deve ter por objetivo em algum momento possibilitar o resgate da liberdade do indivíduo, sem o que a vedação constitucional à pena de caráter perpétuo teria função meramente retórica na Constituição da República. Efetivação dos direitos e o funcionamento deste sistema principiológico que se orientam pelo princípio sociológico da realidade. Análise do tempo de cumprimento da pena. Tempo do preso que não tem a mesma “duração” do tempo do solto. “A pena de prisão se diferencia de todas as outras penas pela forma como combina estes dois elementos: o tempo e o espaço. Esta inserção entre tempo e espaço marca o começo de uma duração distinta, qualitativamente diversa. E isto apesar da pena ser medida com a mesma unidade que se utiliza para medir o tempo social, o tempo comum.” Relatividade do tempo que permite (re)pensar o significado da “duração” da pena privativa de liberdade, ponderando o seu prazo, com os fins que se busca alcançar e os efeitos que ela produz em relação ao apenado. Limite previsto no artigo 75 do Código Penal que se considera para efeito de progressão de regime.

ORDEM CONCEDIDA (PRADO Geraldo, 2008).

                              O acórdão em tela não só defende a supremacia da Constituição, no que tange a vedação às penas de caráter perpétuo, mas também, corrobora a diminuição do limite máximo de cumprimento de pena postulado por Ferrajoli, justamente porque defende a relativização do tempo de prisão. O tempo de cumprimento da pena privativa de liberdade não pode ter como base de cálculo o tempo comum das pessoas não privadas da liberdade, simplesmente porque o sofrimento naturalmente infligido pela prisão, bem como a combinação de tempo e espaço característicos deste instituto, não são vivenciados por quem não está ou nunca foi privado da liberdade.

                               Não foi por menos que o Desembargador Geraldo Prado defendeu a relatividade do tempo do preso, no acórdão supra. A fundamentação trazida a cabo permite uma análise do significado da duração da pena privativa de liberdade. A execução de penas demasiadamente longas não pode trazer – e não traz – nenhum benefício à sociedade, tampouco ao apenado, isto porque, como foi relatado no item 2.1, os dados sociais demonstram que a prisão é criminógena e, portanto, quanto maior o tempo passado no cárcere, menor será a chance de adaptação às regras da sociedade extramuros e maior será a tendência a delinquir. Cabe ressaltar que a pena perpétua não é apenas aquela que sentencia uma vida inteira no cárcere, como também, aquela que aniquila qualquer possibilidade de vida digna pós-cárcere. Isto posto, o cumprimento da pena de prisão deve – leia-se: tem que – ser analisado sob o prisma de efetivação de direitos e garantias fundamentais, bem como do funcionamento de um sistema de princípios que se orientam pelo princípio sociológico da realidade, como bem asseverou Geraldo Prado.

                              Ferrajoli não só defende a redução citada, como, também, a instituição de medidas alternativas, tais como: prisão domiciliar, a limitação de fim de semana, a semiliberdade, a liberdade vigiada, mas não dá forma como estão previstas atualmente – porque integram a pena privativa de liberdade – e sim, como real alternativa à prisão[66].  O autor sustenta que uma vez substituída a pena privativa de liberdade, nos delitos mais leves, pelas atuais medidas alternativas e reduzido seu limite máximo para os delitos mais graves, seriam desnecessárias, em sede de execução penal, as revisões do tempo de cumprimento de pena em função de boa conduta ou análises de cessação de periculosidade[67].

                               .O autor vincula a qualidade da pena à igualdade, legalidade e o caráter apenas privativo. Repudia, portanto, qualquer forma de diferenciação na execução penal, a flexibilidade ou incerteza na duração da pena e qualquer atividade corretiva aplicada durante o cumprimento de pena, defendendo condições de vida no cárcere igualitárias e menos aflitivas. Advoga a tese de que deve haver previsão legal da instituição do trabalho facultativo no cárcere, em conjunto com o maior número possível de atividades coletivas, recreativas e culturais[68], bem como a previsão legal de visitas íntimas, “promovendo a abertura da prisão” (FERRAJOLI, 2009, p. 365)[69], permitindo certamente seu acesso por um maior número de visitantes, concedendo, assim, maior efetividade à direitos e garantias fundamentais, não como prêmio ou privilégio – no sentido de retribuição por bom comportamento carcerário ou mediante lucro, por exemplo – e  sim com a previsão legal de tais direitos de forma igualitária[70] .

                              Uma redução deste gênero suporia uma atenuação não só quantitativa, senão também qualitativa da pena, dado que a ideia de retornar à liberdade depois de um breve, e não após um longo ou talvez interminável, período tornaria sem dúvida mais tolerável e menos alienante a reclusão (FERRAJOLI, 2009, p.381).[71]

                              Conclusão

                              Em face do exposto, não pode ser outra a conclusão: o sistema prisional é desumano e criminógeno, a pena privativa de liberdade é inócua frente à realidade social. É arbitrária, porque sai do campo da legalidade, no exato momento que agride direitos e garantias fundamentais. A pena de prisão encontra-se tão deslegitimada frente aos dados das ciências sociais, que o poder punitivo perdeu sua razão de ser, assemelhando-se, muito mais, a materialização de uma espécie de vingança coletiva. Fundamentada, sempre e inexoravelmente sempre, em um discurso falacioso de defesa social que pretende garantir segurança à sociedade e evitar a vingança privada, mas que, na verdade, estimula o aperfeiçoamento da atividade criminosa e a propagação da violência, soma a dor do delito com a dor da pena. Acarreta consequências desastrosas não só para o apenado, porque transcende o delinquente, para atingir sua família. Transforma uma parcela da sociedade em uma população marginalizada e excluída: prometendo inclusão social, fomenta a separação.

                               Não é possível continuar acreditando numa melhora progressiva do sistema prisional, porque esta, indubitavelmente, não ocorrerá. Não é o sistema prisional que não ressocializa. Não é a falta de verba, tampouco a falta de vontade do poder executivo. Construir mais estabelecimentos prisionais e contratar mais funcionários não resolverá o problema. Com a devida vênia, culpar o poder executivo pela falência da pena de prisão beira a infantilidade. É a própria pena de prisão que, trazendo a retribuição do mal em sua essência é o calcanhar de Aquiles do sistema penal. Contaminada pela violência e pelo sofrimento, a pena privativa de liberdade é a pena de Talião da modernidade. Devolve o mal em forma de uma desumana e cruel restrição de liberdade que marca o apenado e sua família para sempre, estigmatizando-os.

                                 É necessário desconstituir o mito da pena de prisão, expurgando o desejo de vingança e ódio do inconsciente coletivo de uma população orientada para enxergar o desviante como o outro, o monstro, o criminoso.  É necessária a adoção de uma política criminal comprometida com o respeito efetivo de direitos e garantias fundamentais previstos na Carta Constitucional, desprovida da hipocrisia de discursos falaciosos que, na verdade, torturaram de forma refinada a mente e alma daqueles considerados nocivos ao convívio social. A pena de prisão deve ser reservada àqueles mínimos casos em que é indubitavelmente necessária.

                                A posição defendida por Maria Lúcia Karam  inegavelmente contribuiria para a diminuição da superlotação do cárcere, tornando-o mais humano e tolerável.

                                Apesar da inegável diferença teórica entre as teses citadas, cabe aduzir que uma futura abolição do direito penal, postulada pela genialidade de Raúl Zaffaroni, Nilo Batista e, também, de Maria Lúcia Karam, que defende, ainda, uma anistia global e uma comutação de penas, citadas anteriormente, requer, necessariamente, uma abolição gradual da pena privativa de liberdade, primeiramente. Esta, por sua vez, pode ter início, perfeitamente, no direito penal mínimo do Ferrajoli. “O direito penal mínimo é, de maneira inquestionável, uma proposta a ser apoiada por todos os que deslegitimam o sistema penal, não como meta insuperável e, sim, como passagem ou transito para o abolicionismo…”[72] ( ZAFFARONI, 1991, p. 106). A posição de Tiago Vianna também pode significar um avanço na direção de uma necessária abolição gradual da pena de prisão.

                              Toda e qualquer medida que possa contribuir para atenuar o sofrimento e a violência vividos por aqueles que padecem nos estabelecimentos prisionais será bem vinda. É necessária uma profunda mudança não só na lei penal, processual penal e de execução, como no próprio sentido da punição para adequá-la aos fundamentos do Estado de Direito, limitando de forma máxima o Estado de Polícia – que existe no interior do Estado de Direito – para que esta necessária coexistência seja a mínima possível e tolerável. Não é mais cabível aceitar a existência de uma pena que, aplicada concretamente, viola direitos e garantias fundamentais, por amor ao Direito, por amor a Carta Constitucional e ao Estado Social Democrático de Direito ou, então, salve-se quem puder!

 REFERÊNCIAS

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 NUCCI, Guilherme de Souza, Manual de Processo Penal e Execução Penal. 3ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.

 PINAUD, João Luiz Duboc; PEDRINHA, Roberta Duboc (coordenação) et al.  Estudos Contemporâneos das Ciências Criminais na Defesa do Ser Humano. Homenagem a Evandro Lins e Silva: o patrono da liberdade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

 QUEIROZ, Paulo Queiroz. Direito Penal Parte Geral. 5ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

  SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito Penal Parte Geral, 3ed., Curitiba: IPCC; Lumen Juris, 2008.

  THOMPSON, Augusto. A Questão Penitenciária, 5ed., Rio de Janeiro: Forense, 2002.

 ZAFFARONI, E. Raúl; Nilo Batista.  Direito Penal Brasileiro – I. 3ed., Rio de Janeiro: Revan, 2006.

 ZAFFARONI, E. RaúL. Em busca das penas perdidas. Rio de Janeiro: Revan, 1991.


[1]  FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal, 1ª Ed., Rio de Janeiro: Forense, 1990, p. 277.

[2]  FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão, 3ª Ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 339.

[3] FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal, 1ª Ed., Rio de Janeiro: Forense, 1990, p. 279.

[4] ZAFFARONI, Raúl; BATISTA Nilo. Direito Penal Brasileiro – I. 3ed., Rio de Janeiro: Renavam, 2006, p.232.

[5] DOS SANTOS, Juarez Cirino. Direito Penal: parte geral. 3ed., Curitiba: Lumen Juris, 2008, p. 31.

[6] MARCÃO, Renato.  Curso de Execução Penal. 7ed., São Paulo: Saraiva, 2009, p.9.

 

[7] FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal, 1ª Ed., Rio de Janeiro: Forense, 1990, p. 245.

[8] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, vol..I. 10ed., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 112.

[9] Ibid., p.114.

[10] FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal, 1ª Ed., Rio de Janeiro: Forense, 1990, p. 276.

[11]BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, vol..I. 10ed., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 119.

[12] GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral. 10ed., Rio de Janeiro: Impetus, 2008, p. 491.

[13] MARCÃO, Renato.  Curso de Execução Penal. 7ed., São Paulo: Saraiva, 2009, p.1.

[14] DOS SANTOS, Juarez Cirino. Direito Penal: parte geral. 3ed., Curitiba: Lumen Juris, 2008, P.493.

[15] ZAFFARONI, Raúl; BATISTA Nilo. Direito Penal Brasileiro – I. 3ed., Rio de Janeiro: Renavam, 2006, p.43.

[16] Ibid, p. 47.

[17] Ibid., p.117.

[18] ZAFFARONI, Raúl; BATISTA Nilo. Direito Penal Brasileiro – I. 3ed., Rio de Janeiro: Renavam, 2006, p.114.

[19] BRASIL. Lei 7210/1984, art.52. Alterado pela Lei 10.792/2003.

[20] THOMPSON, Augusto. A Questão Penitenciária. 5ed., Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.43.

[21] FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de Direito Penal, 1ed., Rio de Janeiro: Forense, 1990, p. 287.

 

[22] A informação foi obtida com o jornalista André Fernandes, que foi integrante do Conselho da Comunidade, órgão da execução penal, previsto no artigo 61, inciso VII, da Lei de Execução Penal (L.7210/84) à época na qual  Marcelo Freixo foi o presidente.

[23] TEIXEIRA, Duda; BRENHA, Heloísa; CARVALHO, Julia. O Brasil atrás das grades. Veja, São Paulo, n.47, Nov.2010.

[24] GOMIDE, Raphael. Presos enfrentam temperatura de até 57º  C dentro de cela no Rio. Folha de São Paulo, São Paulo, 04 abr. 2010. Disponível em<http://www.follha.com.br.

[25] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 3ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 943.

[26] KARAM, Maria Lúcia. Pela Abolição das  Prisões, pela Abolição do Sistema Penal. Estudos Contemporâneos das Ciências Criminais na Defesa do Ser Humano. Homenagem a Evandro Lins e Silva: o patrono da Liberdade.  Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p.126.

[27] THOMPSON, Augusto. A Questão Penitenciária. 5ed., Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.38. Nesse sentido o autor descreve o funcionamento do sistema prisional, orientado para impedir fugas e garantir, precipuamente, a segurança e a disciplina.

[28] Ibid, p.60.  Nesse sentido o autor descreve o funcionamento do sistema prisional com enfoque no apenado.

[29] KARAM, Maria Lúcia. Pela Abolição das  Prisões, pela Abolição do Sistema Penal. Estudos Contemporâneos das Ciências Criminais na Defesa do Ser Humano. Homenagem a Evandro Lins e Silva: o patrono da Liberdade.  Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p.127.

[30] THOMPSON, Augusto. A Questão Penitenciária. 5ed., Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.80-82.

[31] BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da Pena de Prisão. 3ed., São Paulo: Saraiva, 2004.

[32] MENEZES, Simone Bastos de. Discursos Sediciosos entrevista Simone Bastos de Menezes. Discursos Sediciosos, Rio de Janeiro: Renavan, n.14, 1º e 2º semestres de 2004.

[33] A autora utiliza a expressão em um texto, de título: Família carcerária – população invisível, no qual define os dramas e problemas cotidianos enfrentados pelos familiares dos detentos. Disponível em: <http: //www. foragidos. blogspot. com>.  Demonstrando  a cristalina transcendência da pena aos parentes daqueles que estão privados da liberdade.

[34] KARAM, Maria Lúcia. Pela Abolição das  Prisões, pela Abolição do Sistema Penal. Estudos Contemporâneos das Ciências Criminais na Defesa do Ser Humano. Homenagem a Evandro Lins e Silva: o patrono da Liberdade.  Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

[35] Ibid., p. 130

[36] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão. 3ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 93 e 364.

[37] Ibid., p. 93.

[38] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão. 3ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

[39] ZAFFARONI, Raúl; BATISTA, Nilo. Direito Penal Brasileiro – I. 3ed., Rio de Janeiro: Renavan, 2006, p. 43-45.

[40] Ibid., p.96.

[41] Ibid., p. 108.

[42] Ibid., p.111.

[43] ZAFFARONI, Raúl; BATISTA, Nilo. Direito Penal Brasileiro – I. 3ed., Rio de Janeiro: Renavan, 2006, p. 111.

[44] Idem, p. Penas Perdidas. Rio de Janeiro: Renavan, 1991, p. 89. .

[45] Ibid., p.89.

[46] KARAM, Maria Lúcia apud Evandro Lins e Silva. Pela Abolição das  Prisões, pela Abolição do Sistema Penal. Estudos Contemporâneos das Ciências Criminais na Defesa do Ser Humano. Homenagem a Evandro Lins e Silva: o patrono da Liberdade.  Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 125.

[47] Ibid, p.125.

[48] Ibid, p.125.

[49] Ibid, p.125.

[50]Ibid, p.132 -135.

[51] Ibid, p. 135

[52] ZACCONE, Orlando. Sistema Penal e seletividade punitiva no tráfico de drogas ilícitas. Discursos Sediciosos, Rio de Janeiro: Renavan, n.14, 1º e 2º semestres de 2004, p. 181.

[53] VIANNA, Túlio Lima.  Do rastreamento Eletrônico como alternativa à Pena de Prisão. Temas para uma Perspectiva Crítica do Direito: Homenagem ao Professor Geraldo Prado.Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.

[54] Ibid, p. 1017.

[55] Ibid, p. 1017.

[56] Ibid, p.1021.

[57] Ibid, p.1022.

[58] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão. 3ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 308 – 312.

[59] Ibid, p. 308.

[60] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão. 3ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 310.

[61] Ibid, p. 362 – 364.

[62] Ibid, p. 364.

[63] Ibid, p. 364.

[64] Ibid, p. 380.

[65] Ibid, p. 381.

[66] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão. 3ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 385.

[67] Ibid, p. 382.

[68] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão. 3ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009 p. 385.

[69] Ibid, p. 365.

[70] Ibid, p. 365.

[71] Ibid, p. 381.

[72] ZAFFARONI, Raúl. Em busca das penas perdidas. 5ed, Rio de Janeiro: Revan, 1991.