A gente precisa falar de carnaval

“Eu não espero o carnaval chegar para ser vadia”: o hit de 2017 interpretado por Pablo Vittar e Rico Dalasam divide opiniões até hoje. Entre conservadores e liberais, os efeitos que o principal verso da música traz são traduzidos entre liberdade e promiscuidade.

Nada de novo sob o sol, não é mesmo?

Nunca fui de gostar de carnaval. Aliás, eu nem sabia exatamente o que era. Embora, ainda hoje, a dúvida paire sobre minha cabeça – o que fizeram do carnaval do errejota? – naquela época, era diferente.

Lembro de uma única vez em que fui para a avenida – que, mesmo depois de um dia inteiro de folia, parecia viva. Enquanto minha mãe vendia bebidas e me contava do quanto ainda queria ver a águia da Portela, bem ali do seu lado comecei a catar as latinhas que venderíamos no final do dia, antes de irmos embora. Embora não me recorde exatamente a idade, imagino que tinha algo entre 14 e 16 anos.

Algumas pessoas prontamente avisaram que tinham latinhas para me oferecer. Foi quando, de repente, dois caras tocaram meu braço como se fossem fazer o mesmo, o que não era uma verdade. O que eles queriam era exibir seus genitais para mim.

Lembro de correr, ficar perto da minha mãe e nunca mais querer ir para qualquer lugar que tivesse a referência do carnaval ou, pelo menos, até ter condições de me defender o suficiente daquele tipo de violência.

Embora o clima do carnaval traga essa sensação de liberdade de expressão, principalmente corporal, é também o período quando o lado machista da folia dita que “mulher direita” não sai na rua – se sair, precisa estar preparada a todo e qualquer tipo de vulnerabilidade com seu corpo.

Segundo a Secretaria de Políticas para as Mulheres do Governo Federal, houve um aumento de 90% de denúncias sobre violência sexual contra mulheres no período do carnaval em 2017. De acordo com informações divulgadas pelo “Ligue 180”, a central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência, entre os dias 1º e 9 de fevereiro de 2016 – do pré-Carnaval ao Carnaval – foram 3.174 relatos de agressão. Em 2015, foram 1.158 denúncias feitas entre os dias 10 e 18.

Mesmo com todas as campanhas voltadas para que mais mulheres sintam-se encorajadas a falar sobre assédio, abuso e violência de gênero, muito precisa ser feito e discutido em torno da questão que, sabemos, faz parte do cotidiano das mulheres, mas que se agrava nesse período, justamente pela falsa sensação de liberdade.

Em meio à campanhas que reforçam narrativas como “Não é não”, “Se forçar é assédio”, #MeuCorpoMinhasRegras, é importante salientar o que fazer caso você se sinta ameaçada, constrangida sexualmente ou coagida.

VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER: LIGUE 180
Funciona 24h por dia e é um serviço especializado em atender os casos de violência contra a mulher. As atendentes são sempre mulheres.

VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES:
Conselho Tutelar da sua cidade – Disque 100
Ministério Público – Disque 127
Delegacia da Infância e Adolescência da sua cidade.